Sempre quis ir a Londres, mas nunca fui. Já Paris, cheguei mesmo a comprar um bilhete, mas não embarquei. Hoje queria lá estar.
Adriano Cerqueira
Ao entrar para a faculdade uma das coisas que mais me impressionou foi o facto de ser rara a pessoa que não tinha visitado Londres pelo menos uma vez. No início senti alguma inveja aliada a uma sensação de não-pertença. No meu velho liceu podia contar pelos dedos o número de pessoas que tinham viajado para fora da Península Ibérica, daí ser compreensível estranhar profundamente esta diferença.
Cedo limitei-me a ignorar esse facto, no fundo é um mero pormenor que apenas me forçava a ficar calado nos raros momentos em que esse tema surgia. Apesar de sempre ter tido vontade em visitar Londres nunca fiz nada de forma a concretizar essa viagem. Contudo, por duas vezes isso esteve perto de acontecer.
A primeira ainda no início da minha adolescência quando a Windsor School me propôs para passar um mês em Inglaterra em casa de uma família de acolhimento que recebia alunos estrangeiros. Contudo, o programa custava cento e cinquenta contos (cerca de setecentos e cinquenta euros) o que na altura era um custo muito elevado para os meus pais suportarem. Para não falar que a ideia de passar um mês em casa de estranhos não me agradava em nada. Hoje gostava de ter podido aceitar essa oportunidade.
A segunda foi no meu décimo segundo ano. A minha turma estava a planear uma viagem de finalistas que não a típica semana em Lloret del Mar, e que não envolvesse quaisquer gastos. Para tal procurámos patrocínios e vendemos bolos, entre outras coisas, no liceu de forma a pagarmos a viagem. O objectivo era ir a Londres, contudo, não conseguimos juntar dinheiro suficiente para levar a turma toda lá, mesmo com recurso a companhias low cost. Optámos então por ir a Coruña e Santiago de Compostela onde ficámos cerca de uma semana.
De facto, apenas este ano consegui viajar para fora da Península Ibérica. Apesar das inesquecíveis passagens por Colónia, Amesterdão, Roterdão, Bruges, Leuven e Bruxelas, Londres e Paris ficaram fora do itinerário. A segunda, curiosamente, fez parte do plano de viagem até ao último minuto. Planeávamos ir de comboio directamente para Paris a partir de Charleroi, mas tais gastos iriam implicar um esforço financeiro que nenhum de nós estava disposto a fazer, já para não dizer que apenas íamos passar um dia na capital francesa, o que inviabilizava desde logo qualquer experiência turística digna desse nome.
Tarde ou cedo irei a Londres. Talvez já no próximo ano, talvez um dia vá para lá estudar, trabalhar, viver, como desde sempre planeei. Por enquanto não faz sentido lá ir. Este ano já olhei um T-Rex nos olhos, posso esperar pelo momento em que me encontre directamente por debaixo de um Diplodocus. Sinto que a Londres, mesmo à distância, já lhe disse aquilo que tinha para dizer. Um destino do passado, como um velho desejo, não passa disso, de uma memória guardada de velhas certezas que hoje pouco mais são que simples ilusões.
Destino, fado, sorte, pode ser que um dia, por um destes, ou por outros motivos, o meu caminho passe por lá, mas por agora, é apenas um lugar que, por mais próximo, é para mim eternamente distante.
Já Paris, essa concubina martirizada de uma História ainda por escrever, é um destino que guarda em Lisboa o segredo da sua vontade.
Era 2008, tinha acabado de ganhar um passe InterRail. Passei meses a planear a viagem, reservei várias pousadas nos diversos destinos que propunha visitar. Cheguei mesmo a comprar um bilhete de ida para Paris. Poucos dias antes de embarcar ainda não tinha encontrado alguém que quisesse aventurar-se comigo. Estava convicto que era capaz de fazer esta viagem sozinho, mas no momento da verdade os elevados gastos envolvidos e o medo das diversas coisas que me podiam acontecer sem ninguém ao meu lado para me ajudar, fizeram-me desistir da ideia. O dia do voo chegou e eu não parti.
Talvez devesse ter procurado Paris mais cedo, talvez devesse ter feito algo mais ao invés de simplesmente aceitar a inevitabilidade de algum dia por lá me aventurar. Perdi a minha oportunidade e a janela fechou-se. Já lá vão dois anos e nada mudou. Mesmo Lisboa, que visito pelo menos uma vez por ano, mostra-se demasiado distante. Podia ser tão perto como o Furadouro e, mesmo assim, além do meu alcance.
Hoje queria lá estar. Não desta forma pois sentir-me-ia a mais num sítio já de si sobrepovoado, mas sim ao seu lado, só com a cidade. Talvez um dia, talvez nunca.
Entre Londres e Paris escolho Ovar. Cidade que inúmeras vezes me rejeitou e eu a ela. Lugar que me acolhe sem nada pedir em troca. Sítio que bem conheço. Espaço onde pertenço. Casa.
É difícil lá ficar. É difícil lá querer estar. É mais difícil de lá sair. Hoje não queria lá estar. Hoje não vejo outra cidade onde quisesse estar.
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