Tuesday, September 28, 2010

O Preço de Andar em Quatro Rodas

Gasolina, GPL, seguro, manutenção, óleo, limpeza, estacionamento e, agora também, portagens. Um carro é já de si um investimento bastante dispendioso, mas aquilo que pagamos por ele é apenas a “entrada” para uma vida inteira de despesas.

O combustível é desde logo o gasto mais óbvio. Seja qual for aquele que escolherem, mesmo nos casos dos carros eléctricos, é necessário pagar pela energia que faz com que ele se mova. O seguro é outro acréscimo que mensalmente nos vemos forçados a inserir no carrinho de compras. Para aqueles que compraram o carro às prestações, além do preço de base inicial há que ter ainda em consideração os juros que, por mais baixos que sejam, a longo prazo acabam por ser bastante consideráveis.

A verdade é que um carro de 20 mil euros, com um tempo de vida útil até dez anos pode custar ao seu proprietário bem acima de 40 mil, mesmo que este seja bastante rigoroso com a sua manutenção e não tenha qualquer acidente. Não são estes gastos mais do que suficientes?

Parece que não. Não basta ser necessário pagar para ter carro, para que ele ande, para que ele ande com segurança, e para que em caso de algum imprevisto a assistência seja assegurada. Querem também que paguemos simplesmente por andar com ele.

Siglas. Durante o dia-a-dia é raro não recorrermos a elas. Seja em referência às instituições onde estudamos ou trabalhamos, ou no simples acto de nos referirmos a um determinado clube. As siglas são uma parte tão importante do nosso vocabulário que algumas delas já por si formam palavras capazes de serem vocalizadas, ao invés de meramente nos limitarmos a ditar letra por letra.

Há dias questionava-me sobre o significado de QREN. Quadro de fundos comunitários não parecia encaixar dentro destas quatro letras. Aliás, apenas refiro a ele como quadro devido ao proeminente Q no início desta “palavra”. De facto, QREN desdobra-se em Quadro de Referência Estratégico Nacional. Outra sigla, também ela comum na agenda mediática é SCUT. Esta é mais fácil de descortinar. Via Sem Custos para o Utilizador, ou SCUT. Talvez acharam que o V estava implícito, ou que VSCUT não seria tão “melódico”.

Pois bem, essa sigla encontra-se hoje ameaçada. Já quase tão raras como o Priolo açoriano, as SCUT estão prestes a extinguir-se e até têm data marcada: 15 de Abril de 2011. Contudo, essa data não é uniforme, para algumas é já dia 15 de Outubro que se vão ver forçadas a evoluir para uma aberração com portagens que ainda não se sabe bem como vão funcionar. Já agora, se alguém for capaz de me explicar esta obsessão com o 15, agradecia.

Até era capaz de compreender a necessidade da cobrança de portagens nestas auto-estradas. Afinal, o governo está endividado e alguém tem que pagar a sua manutenção – apesar de na maioria dos países europeus as auto-estradas serem gratuitas, mas isso já é outra história. Mas, se a ideia sempre foi cobrar portagens, porquê eliminar as vias alternativas? De uma perspectiva estratégica até foi inteligente da parte deles, ao eliminar as vias gratuitas alternativas, forçam os utentes a enveredar pelo percurso pago, o que, numa cidade como o Porto irá implicar um lucro de vários milhões de euros mensais, tendo em conta o número de veículos que por lá passam todos os dias.

Eu já não costumo levar o carro ao Porto. A viagem de ida e volta, que no meu caso ronda os 80 Km, implica um gasto de cerca de seis euros – equivalente a um consumo de dez litros a cada 100 Km e a um preço de 0,7 € do litro de GPL. Um bilhete de comboio, mesmo acrescido com uma viagem de metro fica por 5,7 € o que acaba por ir dar ao mesmo, mas sem o inconveniente de ter que o estacionar. Para aqueles não familiarizados com a invicta, ou se paga, ou deixa-se o carro num sítio manhoso em cima de um traço contínuo amarelo.

Mas eu não tenho muita necessidade de ir ao Porto, pelo menos, não agora. Imaginem alguém que viva nos arredores e que trabalha no Porto. Sem alternativas de transportes públicos, vê-se forçado a levar o carro por lá e como o único trajecto implica uma passagem pela A29, não tem remédio se não pagar os custos de portagem. Mesmo com o tal desconto de 100% nas primeiras dez viagens e 15% em cada viagem seguinte, no final do mês são cerca de 40 euros que este utente gasta apenas para poder ir trabalhar.

Infelizmente, cada um só se preocupa com a realidade que o afecta directamente. Parece que as regiões não afectadas pelas SCUT limitam-se a queixar dos gastos das suas contribuições fiscais que são assim direccionadas para a manutenção destas vias. O que acaba por ser uma mera redundância visto que os seus impostos não vão baixar mesmo que todas as SCUT deixassem de o ser neste preciso instante.

Parece algo inútil continuar a apelar à consciencialização contra algo que é inevitável. Mas mais inútil é o silêncio perante uma forte injustiça discriminatória. E sim, eu sei que a A29 não será paga entre Esmoriz e Vilar do Paraíso, mas basta alguém se enganar na saída e a portagem é logo cobrada. Já para não falar que quem vem do Freixo apanha ainda com as portagens da A44 e o sistema é assim, mais uma vez, deturpado contra o utente.

Ter carro é uma forte responsabilidade. É dispendioso, mas útil. É prático, mas incómodo. É caro, é cada vez mais caro.

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