Friday, October 04, 2019

Twitter à distância de onze anos

Aniversário do Twitter

Foi numa aula de Novos Media já no meu terceiro ano de faculdade que me foi dada a conhecer uma nova rede social que, na altura, estava ainda longe de alcançar o impacto mediático que hoje tem. Estou a falar, obviamente, do twitter.

De microblogue, a sala de chat, de um espaço para criar e contar histórias, a uma caixa-de-ressonância de opiniões, ao longo dos últimos anos vi esta rede social evoluir e transformar-se. Muitos daqueles que conheci nesses primeiros tempos há muito que deixaram de participar no dia-a-dia desta rede. Alguns porque já não se identificam naquilo que ela se tornou, outros porque encontraram noutro espaço algo mais aliciante com o qual perder o seu tempo.

Quando comecei a usar esta rede usava-a essencialmente como uma plataforma para partilhar ideias e pensamentos. Era um microblogue usado para partilhar todas aquelas frases soltas demasiado pequenas para justificaram o espaço e a energia que uma publicação em um dos meus blogues exigia.

Cedo comecei a observar que nem todas as pessoas usavam o twitter da mesma forma. Algumas limitavam-se a partilhar ligações de notícias, vídeos ou outro tipo de conteúdo que achavam interessante, enquanto outras tinham transplantado a essência do mIRC para esta plataforma, e usavam-na como uma simples sala de chat para conhecer e interagir com novas pessoas.

Demorei algum tempo, confesso, mas eventualmente aprendi a responder, a fazer retuítes e a interagir com os diferentes utilizadores que povoavam esta rede. Ainda sou do tempo, sim, neste caso terei mesmo que usar esta expressão, mas de facto, ainda sou do tempo em que era possível ver as interacções de um utilizador com contas que nós não seguíamos. Foi, aliás, desta forma que conheci muitas das pessoas com quem interagi nos meus primeiros anos de twitter.

Um dos episódios mais caricatos foi quando aprendi a utilizar hashtags. Já tinha visto pessoas a colocar cardinais antes de uma palavra mas nunca percebi ao certo porque o faziam. Um dia, a acompanhar um evento, perguntei a várias pessoas o que era uma hashtag e qual a ligação que deveria colocar no meu navegador para acompanhar esse evento.

Após algumas tentativas frustradas acabei por recorrer ao Google, onde aprendi que uma hashtag era uma etiqueta precedida de um cardinal usada para ligar uma série de tuítes a um único evento.

Hoje em dia, basta carregar em uma dessas etiquetas para ver todos os tuítes em que elas são incluídas. Naquela altura não. Se queríamos seguir uma determinada hashtag era necessário ainda pesquisar por ela. Felizmente, esta alteração, ao contrário de muitas outras, acabou por ser positiva. Tanto que rapidamente redes como o facebook e mais tarde o instagram também adoptaram esta técnica, ignorando onde a mesma tinha sido originada.

Durante estes onze anos, confesso mais uma vez que nem sempre fui um utilizador assíduo. Por volta de 2012, já muitas das pessoas com quem convivia e falava numa base diária tinham saído desta rede. A partir daí comecei apenas a usar o twitter para divulgar artigos do meu blogue, notícias de ciência, música, vídeos e um ocasional pensamento solto.

Foi em 2015 que decidi voltar a usar esta rede de forma habitual. Comecei a seguir novas contas, a responder e a interagir com novas pessoas e, eventualmente, comecei a criar conteúdo que ia muito além da divulgação de projectos pessoais ou de pensamentos soltos.

Ao fim destes onze anos testemunhei como o twitter, os seus utilizadores, e o universo das redes sociais se alteraram em consonância com as vontades e com as necessidades das pessoas e do mercado digital.

Com esta riqueza de utilizadores com conceitos, ideias, percursos e histórias de vida distintas, o twitter transformou-se naquilo que é hoje. Para o bem, e para o mal.

Ao longo deste processo de transformação aprendi a identificar os diferentes tipos de utilizadores que coabitam nesta rede social. Podemos encontrar onze géneros claros de utilizadores que, primeiro em 140, e hoje em 280 caracteres, usam esta rede com os seus próprios propósitos e objectivos.

Algumas pessoas reflectem um pouco de cada um, mas é ainda possível encontrar exemplos de contas dedicadas apenas a um único foco.

O Ideólogo

Foi uma das primeiras espécies a habitar o twitter. São pessoas que publicam pensamentos e conversas internas sem nunca interagir com ninguém. Se em tempos eram a forma mais popular de usar este rede, hoje são vistos como párias, ignorando por completo um dos principais pilares de qualquer rede social, a interacção.

As Câmaras de Eco

Utilizadores que usam a sua conta para partilhar notícias, vídeos ou ligações sem nunca produzirem conteúdo próprio. Se têm alguma espécie de interacção com outras contas ou utilizadores, fazem-no apenas à base de retuítes.

Os Workaholics

Contas ‘profissionais’ usadas apenas para partilhar eventos relacionados com trabalho, ou com projectos desenvolvidos pelo seu utilizador. A interacção é mínima, usando a rede social como uma montra para eventuais empregadores. São pessoas para quem as redes sociais são uma ferramenta que usam para construir a sua própria personagem. O objectivo final é retirar os proveitos da sua popularidade online para fazer crescer a sua carreira profissional.

Os "papa conferências"

Estas contas limitam-se a fazer o acompanhamento de conferências. A opinião é dada através da selecção das citações dos oradores acompanhadas das hashtags do evento. A maioria apenas funciona uma vez por ano mas alguns parecem fazer vida disto.

Os storytellers

Uma espécie ameaçada que chegou até a ser alvo de notícias há cerca de oito anos. Foram um dos primeiros fenómenos associados a esta rede. Estas contas usam o twitter para contar pequenas histórias. Aspirantes a escritores que encontraram nos 140 caracteres, que agora são 280, o desafio ideal para a sua procrastinação.

Os endoutrinadores

Espécie que apareceu por volta de 2016. Políticos ou aspirantes a tal, que usam o twitter para criar bolhas de opinião onde o debate tem sempre um único sentido. Rodeiam-se de Yes Men que controlam para tentar humilhar e calar quem tem uma opinião diferente.

Os produtores de conteúdo

Especialistas e pessoas comuns que usam esta rede para partilhar e esclarecer temas que podem ou não estar na berra da agenda mediática. Conhecidos por construir longas threads, disponibilizam sempre fontes e ligações para quem quer saber mais.

Os facebookers

Pessoas que cresceram com o facebook e que tentam replicar a experiência que lá tiveram nas restantes redes sociais. Usam o twitter para partilhar fotos e acontecimentos do seu dia-a-dia na esperança de receberem gostos e interacções.

Os perfis ligados

Contas que apenas existem porque ‘temos que estar em todo o lado’. Os seus tweets são apenas links de publicações feitas no facebook ou no instagram. A interacção é rara e muitas vezes inexistente.

Os sociais

Malta que está aqui desde o início e que ainda usa o twitter como uma sala de chat. Dizem ‘bom dia’ e passam o tempo a interagir com outras pessoas, seja através de respostas ou por mensagem privada.

Os trolls

Utilizadores que apenas existem para ver o Mundo a arder. Nunca dizem nada sério. Insultam tudo e mais alguma coisa. Os perfis são falsos e devem ser sempre evitados. Alimentam-se de atenção. Sem atenção acabam por definhar.

Cada um de nós já passou por um destes diferentes estágios num certo momento. Alguns ficaram presos a uma destas identidades, outros fluem entre aquelas que mais se adequam à sua personalidade. É esta riqueza que torna o twitter um espaço tão interessante e, ao mesmo tempo, tão perigoso.

Para mim? Para mim continua a ser aquela casa onde os meus pensamentos, as minhas ideias, as minhas notas soltas sobre um determinado tema, habitam, coabitam e viajam para lá das páginas da minha mente, e para lá da projecção da minha voz, ou da minha escrita.

Não é um espaço que me define, mas é um espaço onde sei que tenho, e onde sempre irei ter, a minha voz.

Wednesday, November 28, 2018

Toxicidade

Imagem DR

Há cerca de três anos decidi deixar o facebook. Esta decisão não foi assim tão simples pois, para mal dos meus pecados, uma das minhas funções na empresa onde trabalhava então era a de gestor de redes sociais.

Tive assim que chegar a um compromisso. Tinha que arranjar uma forma de continuar a usar o facebook sem me ausentar desta plataforma. A solução mais simples passaria por criar um perfil anónimo para gerir a página. Contudo, isto entra em conflito com a minha necessidade de usar o seu sistema de mensagens.

Na verdade queria deixar de usar a timeline do meu facebook, mantendo todos os restantes benefícios que esta plataforma proporciona.

Optei enfim por uma opção de compromisso. Mantive a minha conta activa mas, em vez de abrir esta rede social na sua página inicial, comecei a abri-la na página da empresa. Deixei de fazer novas publicações. Deixei de responder a comentários. Reduzi a minha interacção ao mínimo necessário para não perder o contacto com as pessoas que me são mais próximas.

Para não dar a impressão que tinha de facto deixado o facebook mantive a minha conta de twitter ligada ao meu perfil. Os meus tweets continuavam a ser publicados no facebook sem que alguém notasse alguma diferença. Mas, a seu tempo, também isto deixei de fazer.

Para todos os efeitos, deixei de usar o facebook. Este deixou de ser uma plataforma pessoal e passou a ser apenas uma ferramenta de trabalho. Continuei a alimentar e a gerir a página da empresa, e não deixei de publicitar os meus feitos profissionais, assim como o meu blogue e portefólio, na minha página pessoal.

Contudo, através desta simples acção, consegui libertar-me de uma das minhas principais fontes de ansiedade.

Deixar o facebook foi uma decisão que tomei para o meu próprio bem-estar e para o meu equilíbrio mental. Fora isso, não retirei grandes benefícios palpáveis deste acto. A minha produtividade continuou igual. Sempre soube gerir bem o meu tempo, mantendo-me activo nas redes sociais sem alguma vez falhar qualquer prazo. E, no fim de contas, apenas troquei o meu tempo no facebook por uma mais intensa participação no twitter.

Durante pouco mais de dois anos, a única vez que me atrevia a ir além das páginas que geria era para felicitar alguém pelo seu aniversário.

Usei este tempo para pensar sobre o que me movia contra esta rede. Por que me custava tanto visitar a minha timeline?

A resposta era simples. Por medo. Medo do que podia lá encontrar. Medo do conteúdo tóxico. Medo do sentimento que uma foto, uma notícia, ou um comentário, pudesse despertar em mim.

Uma noite, respirei fundo e decidi limpar a minha timeline de tudo aquilo que era tóxico. De tudo aquilo que era negativo. De todas as pessoas, páginas e eventos que transmitissem qualquer tipo de sentimento destrutivo ou derrotista.

Deixei de seguir todas as pessoas tóxicas. Todos aqueles contactos que dia sim, dia sim, têm algo de frustrante ou derrotista para partilhar. Deixei de seguir todas as pessoas incapazes de ter uma base de diálogo com alguém com ideologias diferentes das suas. Fossem essas políticas, filosóficas, religiosas ou desportivas.

Deixei de seguir todos aqueles que associava a más memórias, momentos, ou recordações. Excepção feita apenas a quem estava lá para mim nesses momentos.

Mas também deixei de seguir algumas pessoas cujo perfil não encaixa nas mais comuns definições de toxicidade. Deixei também de seguir pessoas excessivamente felizes.

Lamento, mas não quero saber dos vossos amores, e desamores, das vossas vitórias, e conquistas, dos vossos sucessos, e carreiras, das vossas viagens, e passeios.

No fim, mantive apenas o meu núcleo de amigos, alguns contactos profissionais, pessoas neutras com vidas normais, e personagens intelectualmente estimulantes, fossem elas académicas, ou simples contemporâneos que, independentemente das suas filosofias colidirem ou não com as minhas, sabiam estabelecer um diálogo digno com a sua oposição.

Não analisei cada contacto individualmente. Avaliei-os consoante o impacto emocional de cada publicação que aos poucos aparecia na minha timeline.

Timeline essa que passou a estar muito vazia. Dominada quase inteiramente por páginas, por notícias, e por artigos de opinião.

Virei-me então para os grupos. Para pessoas com interesses similares aos meus. Fossem estes profissionais, desportivos, ou de entretenimento. Neste momento são eles que dominam a minha timeline. Uns mais que outros é certo, mas todos os dias mantenho-me a par das mais diversas novidades sobre os principais temas que me interessam.

Os restantes contactos não passam agora disso. São apenas uma bola verde no Messenger, de nenhuma forma diferentes de um qualquer número numa lista telefónica. Um pequeno preço a pagar por uma lufada de ar fresco no meu constante combate contra a ansiedade.

Consegui fazer isto sem me fechar numa bolha. Sem me recolher em um círculo de opiniões em comum. Todos os dias participo em conversas interessantes com pessoas que pensam diferente de mim. A maioria delas no twitter, claro, a discussão intelectual há muito que abandonou o facebook.

Os temas hoje em dia são as notícias falsas, a desinformação, a fraca qualidade dos media, e as típicas polémicas do dia-a-dia que tão depressa surgem, como desaparecem.

Continuo a usar o facebook esporadicamente. Já não estou na mesma empresa mas continuo a gerir redes sociais. Evito comentar qualquer publicação fora dos grupos onde sou membro activo. Limito-me a dar os parabéns a alguns contactos e a usar o Messenger para falar com os meus amigos.

O resto? O resto deixou de estar à distância de um clique.

Tuesday, July 11, 2017

Cento e quarenta caracteres

Imagem DR
Cento e quarenta caracteres. Todos os dias escrevo cento e quarenta caracteres. Pensamentos erráticos. Comentários a um evento. Citações de momentos inócuos. Opiniões controversas. Simples partilhas. Pequenas considerações. Encadeadas em sucessões lógicas mais dignas de outro espaço. Um que as não limitasse a cento e quarenta caracteres.

Em 2008 quando comecei a aventurar-me pela microblogosfera que hoje é o twitter, costumava comparar o meu número de publicações, na altura ainda longe de serem conhecidas como tweets, com aquelas que tinha feito até então no meu blogue. Devo ter demorado ainda uns dois ou três meses, mas cedo ultrapassei um número que achava difícil de alcançar. Hoje já lhes perdi a conta. Um breve vislumbre do meu perfil diz-me que são mais de vinte e sete mil.

Vinte e sete mil tweets. Quão ingénuo da minha parte era comparar tão volumoso número aos trezentos e vinte e sete artigos publicados neste blogue. Quantos romances não podiam ser escritos em vinte e sete mil tweets? Quantos poemas. Quantos contos. Quantas crónicas. Quantas críticas. Momentos. Palavras. Pensamentos. Notas. Enfim, um finito número de incontável material que podia já hoje ter publicado, tivessem esses vinte e sete mil tweets, a energia e a lógica necessária para se conduzirem por entre os diversos teclados para papéis capazes de lhes darem forma e um propósito.

Há meses que não escrevo. Não sei como aconteceu. Não tenho um motivo ou uma razão. É apenas algo empiricamente observável pela ausência de publicações neste ou em qualquer outro espaço. Há um ano comecei por reduzir a frequência com que o fazia. Desisti da minha regra dos trinta artigos anuais e mantive-me apenas fiel à habitual publicação mensal. Em Janeiro, até essa fui incapaz de manter.

Podia culpar o excesso de trabalho. A falta de tempo. As viagens. Enfim. Estaria a mentir. Tempo é algo que não me escasseia. Por mais ocupado que esteja numa semana, há sempre outra que compensa. Por mais tempo que passe dentro ou fora de Lisboa, há sempre uma hora vazia, facilmente preenchida por um fugaz dedilhar de teclado.

Não. A culpa não é do tempo. Nem tão pouco da sua falta. A culpa morre solitária em mim. Falta-me motivação. Razão. Inspiração. Uma voz. Falta-me aquele algo que hoje me faz escrever. Falta-me vontade.

Em Novembro, após cinco anos de inactividade dessa particular aptidão, voltei a escrever notícias. Cinco por semana. Todas as semanas. Recordo-me do pânico de uma mente enferrujada incapaz de se lembrar de algo que em tempos era tão natural como qualquer outra minúcia do dia-a-dia.

As primeiras semanas foram exigentes. Não conseguia encontrar as palavras. Os meus dedos ficavam perros e a minha mente vazia. Mesmo com toda a informação necessária à minha frente, era incapaz de a reconstruir em uma narrativa coerente e informativa. Deambulava entre opiniões e vozes de um repórter presente. Sentia falta de um rumo. De uma crítica. De um empurrão na direcção correcta.

Ler o trabalho de outros colegas em situações semelhantes apenas tinha o efeito oposto ao esperado. Em vez de inspirar, desesperava. Mergulhava fundo em busca de um talento que se escapava por entre as ondas de uma mente em constante reboliço.

As primeiras tentativas deploráveis de encontrar algo substancial não passaram de embaraçosas mantas de retalhos, demasiado cruas para servirem de conforto na mais fria das noites. Faltava-me prática. Método. Rotina. Voz.

Este pânico inconstante durou cerca de uma semana. Quem sabe, talvez duas. Comecei por desenhar uma rotina. Planeei os meus dias à sua volta, decido a cumpri-la à risca. O método veio depois. A ele seguiu-se uma voz.

A princípio tímida. Inconsequente. Desconfiada. Insegura. A necessidade, o tempo, a urgência e, enfim, o trabalho, deram-lhe força. De uma notícia por dia, escrita à prolongada velocidade de duas horas desperdiçadas, passei a escrever as cinco todas as sextas-feiras, de uma só vez, no espaço de uma manhã.

Hoje, tenho alguma ajuda, e as cinco são agora duas. Talvez esta recém-descoberta liberdade tenha encontrado na minha inspiração o espaço suficiente para respirar. Talvez seja por isso que hoje escrevo. Ou talvez apenas tenha cedido perante uma inevitável necessidade de o fazer. O tempo o dirá.

As vinte e poucas notícias mensais voltaram a despertar em mim hábitos e técnicas há muito adormecidas. Escondidas por entre a constante barragem de ideias e pensamentos que assolam o íntimo da minha mente. Culpadas, talvez, pela falta de energia e vontade em dar voz a algo capaz de se alongar para lá dos habituais cento e quarenta caracteres. Foram, enfim, uma faca de dois gumes que me silenciou por um período indeterminado.

Escrevo isto hoje sem música. Sem paz. Com ruído e vozes de fundo. Em casa. Depois do jantar. Longe do sótão. Longe do meu quarto. Longe de uma qualquer secretária num qualquer gabinete. Hoje escrevo pois hoje tive voz. Pois hoje tive vontade. Pois hoje tinha que o fazer.

Hoje é apenas um dia como outro qualquer. Um dia em que precisei de mais de cento e quarenta. Pois hoje, afinal, é um dia que não podia ser medido por um simples caracter.    

Monday, May 06, 2013

A Hipérbole das Redes Sociais

Imagem DR
Uma hipérbole não é apenas uma figura de estilo. Aqueles que prosseguiram os seus estudos em matemática até ao final do secundário devem-se lembrar que uma hipérbole pode ser definida como um lugar geométrico de pontos para os quais a razão das distâncias a um foco e a uma recta (chamada de directriz) é uma constante maior ou igual a 1. 

Contudo, não me parece que esta definição seja capaz de vos reavivar a memória. Uma hipérbole compreende duas curvas sem intercepção, chamadas de "braços", que separam os focos. Conforme a distância dos pontos da hipérbole aos focos aumenta, a hipérbole começa a aproximar-se de duas linhas, conhecidas como assimptotas. Este termo já vos diz alguma coisa, certo? Mas ainda não estão bem a ver o que é? 

Bom, a equação mais simples para definir uma hipérbole é y = 1/x. Façamos assim, dou-vos um minuto para irem buscar a vossa velhinha máquina gráfica da gaveta onde a esconderam na esperança de não mais a terem que usar. 

Já a têm? Aposto que perderam uma boa meia hora a jogar puzzle bubble ou um dos outros jogos que todos programámos na máquina para nos entretermos durante as aulas mais entediantes. Experimentem colocar a função y = 1/x. Vêem as duas curvas a aproximarem-se dos eixos do x e do y sem nunca os tocarem? Isso é uma hipérbole. Precisei de 228 palavras só para chegar a um ponto que pouco tem a ver com aquilo que eu queria realmente abordar. Vamos lá tentar outra vez.

Uma hipérbole não é apenas uma figura de estilo. Hipérbole é também o nome de uma função matemática que representa uma curva que se aproxima constantemente de um ponto sem nunca o alcançar. A nível pessoal é aquilo que acontece com a minha capacidade de captação de seguidores nas redes sociais. 

Quando iniciei a minha actividade no twitter recebia diariamente diversas notificações sobre os novos seguidores que por um motivo ou outro lá se lembravam de me adicionar. Muitos apareciam através dos contactos com quem eu falava, isto ainda antes do twitter bloquear a visibilidade dos replies, outros por se interessarem por aquilo que eu tinha para dizer. Chegava a fazer mais de cem tweets por dia entre notícias partilhadas, pensamentos e conversas com os restantes utilizadores.

Sentia-me como se tivesse regressado aos tempos do mIRC. Conhecia pessoas novas todos os dias, comecei a estabelecer uma base de contactos e passei a usar o twitter mais pela componente social do que pela partilha de conteúdos. Com o tempo esta euforia foi diminuindo. Não apenas por causa do bloqueio das conversas alheias, mas também pela minha indisponibilidade para perder tempo com esta rede social. 

Apesar disso, raro é o dia que eu não partilhe uma notícia ou um pensamento no twitter. Já não o encaro como uma versão microblogue do mIRC, mas continuo a preferi-lo ao facebook. Raramente opto pelo share em detrimento do tweetar sempre que leio uma notícia ou outro conteúdo qualquer que me pareça digno de ser partilhado. 

Nos últimos dias ao olhar para o meu número de seguidores no twitter e de amigos no facebook, cheguei à conclusão que não sou capaz de captar mais do que 500 pessoas a aderirem à minha rede. Há já vários meses que o meu número de seguidores no twitter não passa dos 490. No momento em que escrevo este artigo são apenas 487. Lembro-me de um dia ter chegado aos 496. Muito perto do limite psicológico de 500 utilizadores, contudo, falta-me algo para lá chegar. 

Já no facebook, a marca dos 500 amigos foi ultrapassada de forma quase banal há alguns meses atrás. São neste momento 523. Este número é preenchido na sua maioria por colegas do meu curso e dos diversos empregos que tive nos últimos anos. Também lá estão os meus amigos, amigos de amigos e uma ou outra pessoa que conheci num evento, fosse ele social ou não, e que por lá ficaram. 

Já fiz uma análise aprofundada sobre a origem dos meus contactos do facebook. Podem relembrá-la aqui, ou simplesmente ignorar esta frase e continuar a ler esta minha epifania. Ainda estão a jogar puzzle bubble? Tenham cuidado, não gastem as pilhas da máquina antes de experimentarem a equação que eu referi lá em cima. 

O que me tem perturbado nos últimos dias é precisamente o facto desta minha bolha social não se conseguir expandir além dos 500 contactos. Valor esse que já por si é bastante inflacionado. Basta olhar para a minha página profissional do facebook que ao fim de três meses tem apenas 68 likes, sendo que apenas 58 dos quais pertencem aos meus contactos. Isto significa que pouco mais de 10% dos meus amigos do facebook querem realmente saber sobre aquilo que eu faço.

O que posso então fazer para atrair mais pessoas a verem aquilo que eu tenho para dizer? Acusaram-me uma vez de ser demasiado consensual. Dificilmente conseguiria fazer com que mais pessoas lessem o meu blogue se não começasse a ser mais parcial e controverso. Por mais bem escrito que seja, um artigo apenas suscita interesse se conseguir apelar às emoções mais cruas da alma daqueles que o lêem. A verdade é que embora continue a investir na imparcialidade das minhas observações, ao longo dos anos os textos que conquistaram um maior número de visualizações foram precisamente aqueles que apelavam às minhas emoções. 

Encontro-me assim preso a um limite psicológico de contactos e visualizações que, de certa forma, vejo como um forte elemento desmotivador. Esta baixa rede de alcance não reflecte a qualidade e o interesse dos meus conteúdos. Mesmo nos momentos em que me aventurei no comentário político e nos manifestos activistas pouca visibilidade alcancei além de uma partilha ou outra no Google Plus e de um ou dois likes no facebook. Alcance que seria bastante maior se tivesse sido escrito por outra pessoa que não eu. 

Não seria necessário ser alguém famoso ou uma rapariga atraente a fazê-lo. Diariamente vejo textos e artigos de pessoas anónimas e com pouca qualidade de escrita a serem partilhados e difundidos pelas redes sociais. Sejam eles relatos de injustiças ou simples apelos emocionais. Independentemente da sua natureza, posso sempre dar um ou mais exemplos de artigos similares que eu próprio escrevi em tempos mas que não mais de 100 pessoas os leram. 

O que posso então fazer para contrariar esta tendência? Qual a fórmula mágica para rebentar com esta hipérbole e transformá-la numa recta crescente e constante? 

Como já referi diversas vezes, não estou disposto a diminuir a qualidade dos meus artigos. Isto implica uma redução da periodicidade do meu blogue. Um mal necessário, embora compreenda que seja esse o principal factor que me impede de alcançar uma audiência constante e fiel. Mas como posso rentabilizar algo que não me oferece qualquer rendimento além da satisfação pessoal? Com tão pouco tempo livre para usufruir no meu dia-a-dia torna-se complicado, se não mesmo impossível, repetir feitos como os 14 artigos publicados em Dezembro de 2012. Feito esse que motivou a histórica marca de 1135 visualizações num único mês. 

É esta a minha voz e não tenciono mudá-la em favor da fama fácil, apelando ao mínimo denominador comum. 

O importante não é a quantidade das visualizações mas a qualidade das mesmas. Mas se com tão poucas já tive crónicas e contos publicados em revistas o que poderia acontecer se o meu alcance fosse maior? Um contrato com uma editora para escrever um livro? 

Conheço pessoalmente casos em que isso aconteceu. E embora reconheça a qualidade da escrita e da imaginação dessas pessoas, acredito que sou melhor, acredito que a minha voz, que as minhas histórias têm valor e que merecem ser ouvidas.

Divago. A minha máquina gráfica há muito que ficou sem bateria. Para já, sucumbo perante a inevitabilidade matemática da hipérbole das minhas redes sociais. Sucumbo na esperança de um dia ser capaz de forçar o meu caminho para lá da fatalidade desta equação e de alcançar o reconhecimento que a minha voz tanto merece. Irei ultrapassar a barreira dos quinhentos, dos mil. 

A minha onda será imparável.
  

Saturday, March 16, 2013

Good Night, Sleep Tight, Old Friend

Imagem: DR
Dezasseis de Março de 2013. Uma data que facilmente será esquecida pela maioria das pessoas, mas não por mim. Hoje, o MSN Messenger fica online pela última vez. Embora a migração dos contactos para o Skype possa ser feita até 30 de Abril, foi esta a data escolhida pela Microsoft para pôr um fim ao Windows Live Messenger.

Enquanto escrevia este artigo decidi ligar o meu Messenger por mera curiosidade. Já há algum tempo que fiz a migração dos meus contactos para o Skype e a minha conta de Hotmail já se encontra sobre a alçada do Outlook há alguns meses. Não me lembro da última vez que liguei o meu Messenger, certamente já deve ter passado quase um ano desde a última vez que fiquei online, isto sem contar as ocasionais visitas à minha caixa de entrada do Hotmail. 

Neste preciso momento tenho apenas dezasseis pessoas online, a maioria das quais são contactos do facebook que apenas aparecem aqui por ter as duas contas ligadas. Não esperava ser capaz de sequer conseguir aceder ao Messenger mas visto que o prazo de migração de contactos foi alargado até 30 de Abril, possivelmente terei ainda algumas semanas para visitar este velho amigo que há muito tenho negligenciado.

Nunca pensei que eu próprio seria capaz de me desligar do Messenger e trocá-lo de forma tão ligeira pelo chat do facebook e pelo Gtalk. Embora o Messenger não fosse, no sentido mais lato da palavra, uma rede social, nem tão pouco proporcionasse o anonimato ou a casualidade de encontros do IRC, foi durante anos um local predilecto para aprofundar uma relação entre duas pessoas ou para simplesmente ter uma boa conversa. São incontáveis os casos de amigos e colegas que conheci através da vida real, do IRC ou das redes sociais, que fiquei a conhecer melhor por causa da particularidade intimista de interacção um para um que o Messenger possibilitava. 

Foi com alguma relutância que em 2003 migrei do IRC para o Messenger. Na altura via o Messenger como uma sala fechada. Um espaço que não permitia que conhecesses outras pessoas além da tua lista de contactos e que, ao contrário do IRC, tornava mais difícil esconderes-te por trás de um nick. Hesitei bastante. Durante muito tempo mantive os dois programas ligados. Fui gradualmente perdendo interesse pelo IRC até ao ponto em que simplesmente já não tinha motivos para o visitar. Assim que todas as pessoas que me eram próximas passaram a figurar nos contactos do Messenger, fechei as portas do IRC de igual forma como nos últimos anos troquei o Messenger pelo facebook. 

Nunca fui grande fã dos extras que este programa nos fornecia. Raramente tive uma conversa através da webcam. Partilhei pontualmente documentos e ficheiros com colegas do liceu ou da faculdade ou com amigos que queriam dar-me a conhecer novas músicas ou ouvir algumas das bandas que eu gostava na altura. Conto pelos dedos as vezes que joguei algum jogo e na maioria dos casos foi mais por insistência da outra pessoa do que por vontade minha. Para mim o Messenger sempre foi um espaço de chat. Uma plataforma que me permitia ter uma boa conversa com alguém ao fim de um longo dia de aulas ou de trabalho.

Lembro-me das horas que passava impaciente à espera que uma certa pessoa ficasse online. Da frustração de deixar uma conversa a meio sempre que a Internet ia abaixo. E do desespero que sentia quando o Messenger passava horas ou até mesmo dias em manutenção sem permitir o acesso dos seus utilizadores. Tudo isto já faz parte do passado.

As redes sociais e as plataformas de comunicação são feitas de pessoas. Por mais que alguém queira resistir acabamos sempre por ser forçados a seguir a vontade da maioria dos nossos contactos. Quando estes optaram por trocar o Messenger pelo facebook, por mais relutante que eu fosse em aceitar a mudança e por mais incómodo que seja falar com alguém através de um browser, no fim não me restou alternativa que não desviar a minha atenção deste programa e focá-la inteiramente no facebook. 

Sim, há já algum tempo que existem diversos programas que possibilitam unir várias contas de chat e o próprio Messenger também isso permite. Contudo, sou avesso a esse género de conglomerações. Torna-se confuso ver a mesma pessoa ligada em três ou mais locais distintos, tornando assim complexo todo o processo de falar com alguém. Processo esse que deve ser sempre simples. 

O Messenger caiu vítima daquilo que eu próprio receava na altura da transição do IRC. Uma sala fechada apenas te permite ver aquilo que colocas lá dentro. O facebook e o twitter abriram de novo as portas à possibilidade de conheceres pessoas novas. Pessoas que agora já não se escondiam por trás de nicks, mas que publicitavam todos os pormenores mais ínfimos da sua vida pessoal diariamente e para que todos os pudessem ver. 

O Messenger derrubou o IRC, sobreviveu ao MySpace e ao hi5, apenas para sucumbir perante o facebook. Resistiu enquanto pôde mas a partir do momento em que o Skype deixou de ser um rival e passou a figurar dentro da própria Microsoft o seu fim deixou de ser uma suposição para passar a ser uma garantia. Hoje, confrontado com a realidade desse fim apenas me resta dizer adeus.

Até sempre velho amigo, guardo eternamente todas as recordações dos vários momentos que passei contigo ligado. Horas de conversa, de alegria e de desgosto, de bom humor e de seriedade, de aproximação e de discussão, de aprendizagem e de galhofa. Hoje fico offline pela última vez. Hoje despeço-me pela última vez.

*Adriano Cerqueira está offline

Tuesday, October 19, 2010

Distracções

Tenho dificuldade em estar atento, em concentrar-me apenas numa única tarefa. Talvez seja culpa da cultura de multitasking constantemente incutida ao longo da minha formação, talvez seja culpa de mim próprio por insistir em manter o twitter, o facebook e o gtalk ligados ao mesmo tempo que procuro pela vontade de fazer alguma coisa. Estou mais inclinado para apostar na segunda hipótese.

Há uma verdadeira auto-estrada de informação que continuamente submerge-me num oceano de dados inúteis e desnecessários para a eficiente progressão do meu dia-a-dia. Tive um professor que dizia: “Ao aprenderem algo novo guardem-no no vosso disco rígido, não na memória RAM”. Pois bem, embora ele tenha razão, suspeito que o buffer do meu cérebro já ultrapassou a sua capacidade máxima e agora não tem remédio se não armazenar toda a informação no disco. Isto deixa-me sem espaço para assimilar a totalidade das novidades mais pertinentes, para não falar que por vezes sinto como que a entrada de nova informação forçasse alguns ficheiros a serem eliminados.

Mas hoje o problema não é a minha capacidade de retenção de dados mas sim o foco dado às tarefas que tenho em mão. Mesmo a simples escrita destas linhas afasta-me de exercícios mais urgentes e, consequentemente, mais importantes. Contudo, vejo-me mais motivado para o desperdício do meu tempo em textos de auto-reflexão, do que para o dispêndio do mesmo em algo mais produtivo.

Talvez um dia devesse tentar simplesmente não ligar o twitter, o facebook e o gtalk, ou pelo menos um deles. Confesso que são estas coisas que mantêm a minha mente sã, mas são elas também as principais responsáveis pela minha constante distracção. Ver o número de tweets por actualizar na minha timeline obriga-me a parar seja o que for que esteja a fazer. Isto pode então levar a que eu me disperse por um link curioso ou que perca alguns segundos a responder a alguém. O mesmo acontece com o facebook. Quem de vocês nunca se apercebeu que tinha passado os últimos minutos a actualizar a página principal na expectativa de alguma reposta, ou comentário, a algo que lá publicaram?

O gtalk é outra história. Os chats, como qualquer conversa, distraem e obrigam-nos a alguma dedicação, visto ser socialmente incorrecto deixar alguém à espera de uma resposta durante um longo período de tempo. Contudo, este não é um verdadeiro problema, visto que por dia apenas falo com cerca de quatro pessoas, e apenas mantenho uma conversa prolongada com uma ou duas. Como se costuma dizer, “não é por aí”.

A conjugação de todas estas distracções fazem-me questionar da minha real capacidade como multitasker. Talvez seja a minha recém-descoberta dificuldade em assimilar novas ondas de informação, talvez seja este um mero sintoma de uma profunda desmotivação psicológica por falta de um sentimento de realização naquilo que faço. Talvez sejam todos estes motivos, e nenhum deles.

Há meses li um artigo que citava um estudo onde indicavam que fazer uma pausa para consultar o e-mail, ou para aceder às redes sociais, ajudava a aumentar a produtividade no local de trabalho. Hoje em dia é comum ver normas contra o uso das redes sociais, empresas com sites como o twitter ou o facebook bloqueados, e estudos atrás de estudos, feitos apenas para demonstrar o quanto perder tempo a navegar pela Web seja a socializar ou não, acaba por resultar apenas numa quebra de produtividade.

Ontem encontrei uma citação que dizia algo do género “só porque muita gente está no lado oposto, não significa que tu não estejas no lado certo”. Contudo, estou mais inclinado para acreditar que aquele estudo inicial precipitou-se no momento de tirar as reais ilações. Sim, fazer uma pausa de tempos a tempos ajuda a manter alguma da sanidade que, caso contrário, se esvaneceria com a imersão constante na mesma tarefa. Mas uma simples pausa não é o mesmo que várias horas de contínua tentação por parte de redes sociais em perpétua actualização.

A solução é simples, parar de queixar-me, desligar as redes sociais e pôr as mãos ao trabalho.