Friday, November 13, 2015

Em Busca do Vale Encantado

The Land Before Time
Some things you see with your eyes, others, you see with your heart.

Littlefoot’s Mother, The Land Before Time

São raros os filmes que podemos ter a sorte de ver pela primeira vez em mais que uma única ocasião. Foi assim que começou a minha história com o Em Busca do Vale Encantado. O filme estreou em 1988 nos EUA, o mesmo ano em que nasci, mas apenas chegou a Portugal a 28 de Julho de 1989, mesmo assim, ainda era demasiado cedo para eu ter qualquer ideia ou vontade de o querer ver no cinema.

Tive que esperar mais sete anos por um dia de aulas especial. A minha professora da primária trouxe o filme em VHS para vermos naquela tarde. Não me recordo bem do ano, mas creio que foi em 96. Lembro-me que era uma tarde primaveril, não muito quente, nem muito fria. A minha escola não tinha os melhores meios, a única televisão que tínhamos já era velha, mesmo na altura, e bem pequena. Sentámo-nos todos em U nas cadeiras ou no chão a ver o filme, ou pelo menos a tentar. Na altura não o consegui ver bem. As outras crianças estavam impacientes, queriam brincar ou apenas estar na conversa. Lembro-me de algumas cenas do filme, meros flashes de recordações. Lembro-me do tom sombrio do ataque do Sharptooth, e da mãe do Littlefoot a defender o seu filho. Mas pouco mais.

A verdade é que na primeira vez que vi o Em Busca do Vale Encantado, não lhe prestei qualquer atenção. Meses mais tarde, o filme passou na RTP. Vi-o com a mesma atenção que dava a qualquer desenho-animado que encontrava na televisão, era já a segunda oportunidade que este filme tentava apelar à minha imaginação, mas por um motivo ou outro eu teimava em não ceder.

Foi apenas em Dezembro de 1997 que o vi pela primeira vez, que o vi verdadeiramente pela primeira vez. Nesse mês a RTP preparava-se para estrear na televisão nacional o Jurassic Park. Para comemorar essa data, esse Dezembro foi o mês dos Dinossauros. As semanas que antecederam a estreia do Jurassic Park ficaram marcadas por três filmes do Em Busca do Vale Encantado, todos eles dobrados em Português Europeu. Três versões únicas que nunca foram comercializadas em VHS ou DVD. Na primeira semana mostraram o filme original.

Embora já o tivesse visto duas vezes antes, desta vez fiquei agarrado. Lembro-me de chorar quando a mãe do Littlefoot morreu, da sensação de espanto e de felicidade que me assolou quando o Vale Encantado é revelado para o Littlefoot entre as nuvens no topo da cascata. Lembro-me da montanha russa de sensações que este pequeno filme me fez sentir. Quando terminou estava tão feliz. Sentia-me tão parvo por o não ter conseguido ver nas outras oportunidades que tive. Foi aí que a minha paixão por esta série de filmes começou.

Na semana seguinte mostraram o Em Busca do Vale Encantado III, O Tempo da Grande Partilha. Por algum motivo saltaram o segundo filme. Só o descobri meses mais tarde na biblioteca municipal. O terceiro filme foi durante muitos anos a minha sequela menos preferida. Passava bem sem o ver, muito por causa do primeiro e do segundo, mas mais ainda por causa do IV.

Dias antes da estreia de Jurassic Park, a RTP mostrou o Em Busca do Vale Encantado IV, Viagem através da Neblina. Nessa tarde tive que ir a um evento religioso numa terra longe de Ovar com os meus pais e a minha avó. Deixei então o vídeo a gravar para o poder ver mais tarde, e foi a melhor coisa que podia ter acontecido.

Quando alguém me pergunta qual é o meu filme preferido, a minha resposta é sempre a mesma, o Em Busca do Vale Encantado. Sem hesitações. Contudo, foi o quarto filme, a Viagem através da Neblina que me manteve colado a este franchise. É, até este dia, a minha sequela preferida e rivaliza com o filme original por um lugar especial no meu coração. A versão em Português Europeu é tão perfeita, das melhores dobragens que alguma vez vi. Tenho pena que a nunca tenham comercializado, contudo, graças a esse feliz infortúnio de a ter gravado, ainda hoje tenho comigo, agora em DVD, uma das poucas cópias alguma vez gravadas desta versão.

Não consigo sequer ver a versão em Português do Brasil, e mesmo a original em Inglês fica em segundo plano quando comparada com esta minha cópia do Em Busca do Vale Encantado IV. No ano seguinte consegui gravar também o filme original, já o III não mais voltou a ir para o ar.

A Viagem através pela Neblina é a sequela perfeita. Apresentam Ali, uma Long Neck como o Littlefoot, e a personagem que mistificou a série com a promessa do seu regresso. A cada nova sequela que saía aguardava impacientemente por algum sinal do seu retorno. Contudo, este apenas aconteceu na série de TV que já chegou tarde em 2007. Tarde e de uma forma desapontante, num episódio onde pouca ou nenhuma atenção é dada à personagem.

A minha paixão pelo Em Busca do Vale Encantado tardou a chegar, mas quando finalmente o senti, não mais o larguei.

Este Verão recebi a melhor notícia que nem em sonhos acreditava alguma vez chegar a ouvir. O Em Busca do Vale Encantado XIV estava em produção com estreia marcada para Fevereiro/Março de 2016.

Nove anos depois da última sequela e da série que acabaram com o franchise, o Em Busca do Vale Encantado está de regresso. Littlefoot, Cera, Ducky, Petrie e Spike estão de volta em mais uma nova aventura, após um longo período de ausência.

Voltei a escrever em fóruns e todos os dias procuro por novas informações sobre a data de lançamento do novo filme. O trailer deixou-me ansioso por este reencontro com as personagens que durante tantos anos ocuparam as minhas tardes. Dos meus mais velhos amigos ficcionais, da série de filmes que faz mais parte de mim do que qualquer outra coisa na minha vida.

Sinto-me como quando era criança e via os anúncios do lançamento das novas sequelas no Cartoon Network, e calculava pacientemente o número de meses que estas iriam demorar a chegar a Portugal.

Após tantos anos de ausência o Em Busca do Vale Encantado está de volta e não podia estar mais feliz.

Monday, December 17, 2012

Pipocas? Não, obrigado

Imagem DR
Lembro-me bem dos longos serões no velhinho Cineteatro de Ovar, onde eu com os meus dez anos, fazia fila para ver estrear filmes que hoje são clássicos, como o The Lost World Jurassic Park, ou o Titanic. Embora o nosso cinema recebesse os filmes com um mês de atraso em relação às grandes salas do Porto e de Lisboa, as duas plateias encontravam-se sempre cheias. Lembro-me de me sentir intimidado pela grandeza da sala e da enorme tela que para uma criança como eu, parecia ser do tamanho do mundo. Mesmo agora ainda consigo saborear as pipocas vermelhas que comprava no balcão em frente à entrada da primeira plateia.

Mas os anos foram-se passando e o Cineteatro fechou. Sem dinheiro para obras de restauração e com uma morosa e complexa disputa de bens em tribunal por parte dos proprietários, o edifício acabou por se transformar numa ruína sem propósito mesmo no centro de Ovar. Construiu-se um Centro Comercial, abriu-se uma sala de cinema e um drive-in. Cinema ao ar livre sem ter que sair do carro, ao estilo americano dos anos 50. “Cinema Paraíso” era assim que se chamava. Mas nem com uma promoção de sete euros com bilhete e refeição incluída, foi capaz de sobreviver mais do que cinco anos.

Há muito que me tinha habituado a não ver cinema em Ovar. Durante anos adoptei os cinemas de Oliveira de Azeméis e de um antigo Centro Comercial próximo de Santa Maria da Feira, como “casa”, embora, sempre que possível me deslocasse às salas do Gaiashopping, do Arrabidashopping, ou do Fórum Aveiro. Contudo, também os cinemas de Oliveira e da Feira acabaram por fechar. Além do preço do bilhete, que com o passar dos anos continuou a aumentar de forma proporcional ao número de pessoas que deixavam de ir ao cinema, para satisfazer a minha vontade de ver um filme, teria que incluir o preço do bilhete de comboio ou da gasolina. Muitas vezes, aproveitava as viagens semanais que o meu pai fazia ao Porto para visitar os familiares, e lá ficava eu no Gaiashopping a ver um filme.

Hoje em dia apenas vou ao cinema em São João da Madeira, nos cinemas Castello Lopes do 8.ª Avenida, e em Aveiro, nas salas Lusomundo do Glicínias. Já fui em tempos aos cinemas UCI no Arrábida ou às salas do Norteshopping e do Parque Nascente, mas dada a extinção das SCUT na A29, aliada ao menor nível de trânsito que Aveiro tem em relação ao Porto, o Glicínias acaba por ser a opção que fica mais em conta na relação preço/qualidade.

Também olho com saudades para as salas do Medeia no Shopping Cidade do Porto, foi lá onde vi a estreia do Control, mas também foi lá a primeira vez que assisti a um filme sem mais ninguém na sala além de mim. Era Maio de 2009, estava a fazer horas para uma aula de Russo que apenas começava às 19h30 quando decidi apanhar a sessão das 17h para ver o Star Trek. Se não fosse por mim, talvez pudessem ter poupado algum dinheiro na iluminação.

Não é que não goste de ter uma sala de cinema só para mim. Em Agosto deste ano fui ver o Rock of Ages ao Glicínias e embora estivesse acompanhado, tínhamos a sala só para nós. Cantámos todas as músicas em sintonia com o filme e divertimo-nos mais naquela sala do que se esta estivesse cheia de espectadores. Contudo, o cinema não foi feito para ser visto de forma tão particular. É um espectáculo de audiências que merece muitos espectadores. Tudo bem que esta era a sessão da meia-noite de uma segunda-feira, mas sendo Agosto não havia desculpa para a sala estar vazia.

Segundo o Instituto de Cinema e Audiovisual (ICA) até Maio deste ano, o número de espectadores que foram ao cinema caiu 16% em relação ao mesmo período do ano anterior. Já em 2011, tinha havido uma queda de 18% nos bilhetes vendidos em comparação com 2010. As salas estão a ficar vazias. As pessoas estão a deixar de ir ao cinema. Em 2011, foram menos 820 mil espectadores ao cinema do que em 2010. Houve uma perde de quase um milhão de bilhetes em apenas um ano! Isto é bastante alarmante.

Eu próprio sou um espectador assíduo, e raramente passo um mês sem ir pelo menos uma vez ao cinema. Pois bem, em 2012, fui apenas nove vezes ao cinema. Consigo facilmente enumerar os filmes que fui ver:  American Reunion; The Hunger Games; Cloud Atlas; The Hobbit: An Unexpected Journey; The Dark Night Rises; Rock of Ages; The Lucky One; Looper e Ted. Se tivesse pago o preço de bilhete normal (6,50 €), teria gasto 58,5 euros, o que até parece pouco, mas relembro que apenas fui ver nove filmes e nenhum deles foi em 3D. Felizmente, até Agosto beneficiei do Cartão Cultura Sábado que, tal como o Cartão Zon, na compra de um bilhete nos cinemas Lusomundo oferece outro. Por diversas vezes, dividi o bilhete com outra pessoa e apenas paguei metade. Além disto, em pelo menos duas ocasiões ofereceram-me um bilhete. Quando o meu cartão expirou (ainda não o renovei) aproveitei o desconto do Cartão Jovem que reduz o preço do bilhete para 5,5 euros. A acrescentar a isto ainda tinha o preço do combustível – ainda bem que não sou fã de comer pipocas, caso contrário teria que reduzir as minhas idas ao cinema para uma ou duas por ano. E é isso que muita gente faz.

Ir ao cinema já não é tão comum, ou tão fácil como antes foi. Mesmo se tiveres a sorte de ter um grande Centro Comercial com uma boa sala de cinema na tua cidade, vais acabar por pagar um balúrdio só para ver um filme do qual podes até nem gostar. Eu próprio já uso a expressão “não valeu a pena gastar seis euros para isto”. Ainda me lembro de ir ao cinema por 200 e poucos escudos (pouco mais de um euro). Não digo que seja necessário reduzir tanto o preço, mas se existem muitas pessoas com Cartão Zon a ir ao cinema por 3,75 €, porque não terminar com essa discriminação e passar todos os bilhetes para esse preço?

As salas ficariam mais cheias, os Centros Comerciais e as suas zonas de restauração teriam um lucro maior e as pessoas passariam a poder apreciar os filmes no seu ambiente natural de exibição. Tornámo-nos num povo exigente e picuinhas que apenas vai ao cinema se o filme for um grande blockbuster, ou se gostar muito do trabalho do realizador, do guionista ou da história que está por trás do filme. E o cinema português acaba por ser a maior vítima desta trama. Se já é difícil convencer as pessoas a irem ver os grandes filmes de Hollywood, como fazemos com que o povo pague para ver produções nacionais que são vistas pelo comum dos portugueses como “obras presunçosas de autor sem sentido”, “aborrecidas”, “demasiado intelectuais”, ou simplesmente “más”.

É impossível quebrar este estigma e todo este preconceito que existe sobre o cinema português, enquanto as grandes salas continuarem a cobrar estes valores exorbitantes. Não estamos longe de pagar 10 euros por um bilhete de cinema. Experimentem ir ver um filme 3D sem óculos e ficarão a desejar ter esperado para que o filme estivesse disponível online.

Vou continuar a ir ao cinema sempre que puder e sempre que os filmes me despertarem o interesse. Mas já hoje me questiono se vale a pena pagar por um bilhete mais do que o preço do DVD do filme. Para já, guardo na memória aqueles serões no Cineteatro de Ovar, adocicados pelas pipocas vermelhas daquele balcão. Anseio pelo dia em que os possa repetir sem qualquer mágoa pelo dinheiro que acabei de gastar, ou pelo cansaço da viagem que tive de fazer.