Le Violon Bleu de Raoul Dufy |
What I wish to show when I paint is the way I see things with my eyes and in my heart.
Raoul Dufy
O Violino Azul de Raoul Dufy. Há cerca de dez anos, numa visita a Serralves, comprei uma cópia deste quadro. Mandei-a emoldurar. Queria pendurá-la no meu quarto. As suas paredes brancas entediavam-me. Queria cor. Queria algo que lhe desse alguma identidade. Guardei esse quadro numa prateleira qualquer, e assim ficou. Durante dez anos. Ali ficou.
A ganhar pó, ainda envolto no seu plástico original, esquecido, no canto de uma estante. Há duas semanas decidi que era hora de fazer alguma coisa. Retirei-o do plástico e procurei por um espaço na parede onde o pudesse pendurar. Mesmo por cima da aparelhagem, entra a televisão e a estante.
Num final de tarde, já cansado de mais um longo dia de trabalho, e depois da habitual passagem pelo Continente, fiz um desvio até ao Leroy Merlin. Por entre molduras e outros materiais, encontrei os tais pregos de fixação. A última peça num puzzle com já uma década de atraso.
Este sábado escolhi o local, um pouco mais acima daquilo que tinha imaginado e fixei-o na parede. Após uma tão longa espera finalmente pendurei o Violino Azul inspirado por Raoul Dufy.
Agora que o posso contemplar sempre que visito o meu quarto, sinto uma ligeira sensação de desapontamento. Pendurei-o um pouco alto de mais, e ligeiramente mais para a direita do que tinha planeado. Mas, agora, talvez pela primeira vez desde que para lá me mudei, sinto que o meu quarto está finalmente decorado como o imaginava. Do Violino Azul, ao Pinguim de Macaroni, do mini Atomium, também ele há cinco anos fechado numa pequena caixa, até à primeira foto que alguma vez revelei, e aos sets de Lego que há dois anos recuperei após décadas de negligência entre sótãos e caixas caóticas de velhos brinquedos.
O meu quarto sempre teve a sua própria personalidade, reflexo da minha, ou de uma mescla caótica, entre o meu Eu e o desejo dos próprios objectos que nele habitam. Hoje são raros os momentos que o visito. Apenas o reservo por duas noites todas as semanas. Já assim o faço há dois anos, e assim continuarei a fazer, pelo menos durante o futuro próximo.
O que é então o meu quarto? Uma exposição de objectos não-essenciais que coleccionei ao longo dos anos? Um retrato da minha infância, adolescência, enfim, da minha vida? Uma instalação de arte? Um museu dedicado a mim próprio? Ou apenas um local para dormir quando regresso a casa, e onde guardo aquilo com que mais me identifico.
Cada objecto no meu quarto tem uma história. Cada álbum, cada livro, cada pedaço de memorabilia, cada brinquedo, enfim, cada coisa que hoje e sempre o compôs.
Nunca senti o meu quarto como algo feito para ser mostrado ou exibido. Nunca o achei como um espaço adulto, mas sim como um local meu, apenas meu, composto por tudo aquilo que eu gosto e que em tempos me fez feliz. Será sempre um projecto em construção. Alterável. Inconstante. Único.
Durante dez anos adiei pendurar aquele quadro. Durante uma década esqueci-me dele num qualquer canto. Uma recordação constante de mais um entre muitos projectos inacabados, enfim concluído, por uma ligeira onda de inércia que me forçou a agir.
O Violino Azul de Dufy. O mais recente ocupante do meu quarto. Um hóspede há muito habitué que, finalmente, teve direito ao seu lugar de destaque.
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