Tuesday, September 14, 2010

Intermission, O Intervalo do Segundo Acto

Recomeça… se puderes, sem angústia e sem pressa e os passos que deres, nesse caminho duro do futuro, dá-os em liberdade, enquanto não alcances não descanses, de nenhum fruto queiras só metade.
Miguel Torga

O segundo acto pode ser muito difícil de se escrever. Encontrar o ponto certo da história que faça a ponte entre a apresentação do conflito e a sua resolução. Às vezes deixamo-nos envolver pelo elenco e passamos tão subtilmente por essa transição que nem sequer tomamos conhecimento dessa existência. Outras vezes, a história apenas muda, num momento estamos no primeiro acto e no seguinte somos levados para o meio do segundo, com pouco ou nenhum aviso. Talvez este último descreva da melhor forma o início do meu segundo semestre.

Ao entrar neste mestrado foram dadas várias opções para as disciplinas em que poder-me-ia inscrever no segundo semestre, das quais teria que escolher apenas três. As minhas primeiras escolhas recaíram sobre Fotografia e Cinema, Sistemas Gráficos e Animação 3D e Interfaces Multimodais. A mudança de paradigma na minha proposta de tese fez-me optar, ainda no primeiro semestre, por Tecnologias Web em detrimento de Interfaces Multimodais. Embora a primeira tivesse exame – o último e único exame que tive de fazer na segunda metade deste primeiro ano – a necessidade de aprofundar os meus conhecimentos de programação para a Web, motivaram-me a pôr de lado Interfaces Multimodais, disciplina que na altura não sabia sobre o que iria tratar, nem tão pouco havia informação sobre os seus objectivos e respectivo plano curricular.

Contudo, esta não foi a única alteração ao plano de estudos que inicialmente delineei. Em Janeiro, no final de uma aula de Tecnologias da Comunicação Multimédia, um professor da minha licenciatura foi lá apresentar uma nova disciplina dedicada apenas ao desenvolvimento e produção de um Documentário. Os interessados teriam que optar por Laboratório Multimédia II e Guionismo. As aulas seriam dadas em parceria com o Mestrado em Ciências da Comunicação da UP, e, para tal, teríamos ao nosso dispor salas de aula, equipamentos de filmagem e apoio técnico por parte da TVU, empresa de conteúdos multimédia sediada nas mesmas instalações. A ideia pareceu-me bastante aliciante, e apesar de me ver forçado a abdicar de 3D juntamente com Fotografia e Cinema – que acabaria por ir dar ao mesmo, só que com um nível de desenvolvimento muito inferior –, inscrevi-me na disciplina de Produção de Documentários. Foi a melhor decisão que podia ter tomado.

E assim as três opções iniciais deixaram de figurar no meu plano de estudos sem que eu tenha dado um passo sequer para dentro de uma sala de aula.

Devido aos atrasos nas apresentações de Sistemas Digitais Interactivos, as minhas férias entre semestres foram reduzidas a dois dias. Como já se tinha passado no primeiro semestre as aulas começaram com um atraso considerável, pelo menos aquelas que eram leccionadas na FEUP. A primeira a ter início foi a disciplina de Produção de Documentários. Regressar ao meu velho curso foi uma verdadeira lufada de ar fresco em comparação com os últimos meses passados na Faculdade de Engenharia. Voltar a ter aulas a 15 minutos a pé da estação, sem necessitar de fazer transbordos no metro, era mesmo o que estava a precisar. O stress da viagem que por vezes chegava a hora e meia entre Ovar e Paranhos criava uma tensão demasiado forte sob o meu estômago, principalmente depois dos problemas de saúde que tive por essa altura.

A disciplina em si foi a melhor que tive neste primeiro ano. Não fosse por ela e talvez tivesse desistido do mestrado. Embora tenha dado bastante trabalho, foi bom poder fazer algo que realmente sabia fazer, poder melhorar a minha experiência na edição de vídeo e produção de documentários, e abrir caminhos para a minha definitiva proposta de tese.

As aulas eram dadas por Soraia Ferreira, da Yellow Entertainment, produtora sediada em Gaia, José Azevedo, professor de Guionismo e Artur Pimenta Alves, director do Doutoramento em Médias Digitais. Pontualmente, Andrew Garrison, professor convidado da Universidade de Austin, Texas, também lá aparecia para dar a sua opinião sobre os projectos e encaminhar algumas das nossas ideias.

Desenvolvemos dois projectos ao longo do semestre. O primeiro, um documentário individual com a duração máxima de três minutos. Fiz o meu sobre a produção do Pão-de-Ló de Ovar, na confeitaria Flor-de-lis. O segundo, e mais importante, um documentário de dez minutos que seria realizado em grupo, desde a ideia até à sua execução. Cada um de nós propôs uma ideia. Duas delas foram escolhidas e dois documentários produzidos. A minha proposta foi sobre a sobrevivência dos quiosques de jornais, mas a falta de um personagem concreto motivou que fosse deixada de parte. As propostas escolhidas foram The Uberman Schedule, em que participei, e outra sobre os perigos da falta de privacidade nas redes sociais, nomeadamente, no facebook.

The Uberman Schedule documenta a experiência de David Silva, o colega que propôs a ideia. Durante 10 dias o David tentou “sobreviver” a um horário de sono que implicava dormir apenas 20 minutos de 4 em 4 horas, em vez de dormir as 8 horas habituais. Todas as peripécias envolventes tornaram a realização deste documentário ao mesmo tempo exaustiva e empolgante. Nalguns dias não era apenas o David a viver sob o horário do Uberman Schedule, nós também o acompanhámos, pelo menos num dia em que o guião nos levou até à Maia, onde o David vive, por volta das 4 da manhã para filmar um jogging ultra-matutino.

O limite de dez minutos acaba por ser a principal crítica ao desenvolvimento do documentário em si. Isso e a interacção com os alunos de Som que não conseguiam compreender o tom que pretendíamos dar a este projecto. Um projecto deste calibre devia ter direito a um tempo mais extenso de exibição. Acabámos por editar uma versão de 13 minutos que para já conta com uma participação no Festival de Vídeo Universitário UFrame, que terá lugar na Coruña no início do próximo mês.

As aulas em si eram bastante interactivas e dinâmicas. Víamos documentários e comentávamos as técnicas usadas. Apenas lamento a falta de tempo para desenvolver tópicos como a construção de um guião e toda a produção por detrás do desenvolvimento de um documentário, temas que por si só davam disciplinas independentes e até mesmo licenciaturas próprias. Mas foi dado aquilo que podia ser dado com o tempo e recursos ao nosso dispor. Embora o mais importante tenha sido o projecto em si, terminei a disciplina com 16.

Agora vem o outro lado da moeda, as restantes disciplinas. Neste segundo semestre apenas tivemos uma cadeira obrigatória, Metodologias de Investigação e Gestão de Projecto. Esta disciplina é dividida em duas componentes Metodologias de Investigação, leccionada por três professoras da Faculdade de Letras e Gestão de Projecto, leccionada por outros três professores da Faculdade de Economia.

A primeira que pensava poder indicar-me um melhor caminho para o desenvolvimento da minha ideia de tese, acabou por desapontar. As aulas eram entediantes e apenas davam matérias já antes leccionadas durante a licenciatura. O projecto consistiu do desenvolvimento da ideia – sim, da ideia, nem sequer um projecto de investigação foi – de um projecto de investigação, com recurso ao software online ideapuzzle. Nem tudo foi um total desperdício de tempo, o ideapuzzle mostrou ser uma ferramenta muito útil na preparação de uma tese e tenciono voltar a recorrer a ele no futuro.

Já Gestão de Projecto foi uma completa idiotice. É que não há mesmo outro termo. Tivemos apenas 3 aulas em que os professores falaram sobre marketing e outros aspectos da existência de uma empresa no mercado. Tudo muito por alto e com pouco fundamento. No final pediram-nos um plano de negócios de uma empresa inventada por nós, sem qualquer base ou modelo para o desenvolver. Como se isto não fosse mau o suficiente, apenas soubemos as notas na semana passada, isto quando legalmente todas as classificações do segundo semestre tinham que ser atribuídas até 31 de Julho. Tive 14, a nota mais baixa que tive até agora neste mestrado.

Por fim, falta referir Tecnologias Web. Embora a professora tenha-se mostrado bastante disponível e fosse clara no ensino dos temas abordados, os conteúdos estavam algo desadequados à realidade da disciplina. Em cerca de 10 aulas, abordámos 9 linguagens de programação para a Web. É impossível desenvolver profundamente uma linguagem de programação com apenas três horas de aula. Quem pouco ou nada sabia, saiu de lá a saber apenas um pouco mais, e quem já tinha algum background nesta área acabou por ficar a saber o mesmo e a fazer a disciplina apenas por fazer.

A avaliação baseava-se em três pequenos projectos que interagem entre si para a criação de um trabalho final que consistia no desenvolvimento de uma aplicação Web. O meu grupo acabou por fazer um site sobre colecções de Canecas em que o utilizador podia criar o seu perfil e assim organizar a sua colecção de canecas.

Tecnologias Web foi a única cadeira com exame que tive no segundo semestre. O exame é de consulta e bastante acessível, contudo, requer algum estudo. No total dos trabalhos e do exame, terminei a disciplina com 16.

Este segundo semestre foi mais calmo e em vários aspectos melhor que o primeiro. Contudo, a grande maioria dos problemas evidenciados no semestre anterior mantiveram-se. Este mestrado necessita de uma forte remodelação a nível de plano de estudos. Talvez uma maior aposta em disciplinas dedicas à aprendizagem de tecnologias fosse o caminho a seguir. A ideia de grupos multidisciplinares embora seja boa, acaba por não ajudar no crescimento do conhecimento dos alunos, pelo menos, não da forma como é hoje implementada. Cada um de nós chega ao ano da tese com praticamente os mesmos conhecimentos com que iniciou o mestrado, o que nos força a enveredar por um projecto dedicado apenas à área que corresponda ao nosso background do primeiro ciclo de estudos superiores.

Resta agora saber o que o próximo ano me reserva, até lá questiono-me se esta terá sido, de facto, a melhor opção.

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