Poucas coisas me entristecem mais do que ver jovens com o espírito quebrado a apaticamente aceitarem condições desumanas com um forte desrespeito pelos seus direitos como trabalhadores em troca de umas míseras ninharias.
Os tempos que vivemos levam as pessoas ao desespero. Fala-se de emigração forçada e de desempregados crónicos. Os mais velhos reivindicam os direitos que lhes foram retirados com protestos vazios e greves constantes. Mas enquanto tudo isto se espalha pela boca do povo, os poucos jovens que lá se conseguem safar no mercado de trabalho vêem-se resignados com condições precárias, direitos deturpados e sobrecarregados de deveres que atingem o limite do esclavagismo. E tudo isto com salários que na maioria dos casos não reflectem nem o seu valor como profissionais, nem a sua experiência profissional, nem tão pouco a sua formação académica.
Entristece-me ver pessoas que, ao final de um mês de trabalho, acumularam horas extra suficientes para merecem mais do dobro que aquilo que ganham, aceitarem com um encolher de ombros o ultraje natural que é não receberem um cêntimo sequer de compensações pela carga excessiva de horas. As empresas aproveitam-se da actual conjuntura para maltratar os seus trabalhadores. Negam-lhes subsídios de saúde e de alimentação, arranjam artimanhas para não formalizar os contratos, adiam os pagamentos sem quaisquer justificações e esperam que a pessoa, qual cãozinho obediente, apareça todos os dias à mesma hora e se sujeite a permanecer lá até à hora que lhes bem apetecer.
Basta desta apatia! Por maior que seja o desespero e por maiores que eles vos pareçam, nada merece tamanhos maus-tratos. O mais triste em tudo isto é que a culpa não é apenas da ganância das empresas, é de nós próprios e daqueles que vieram antes de nós e que se limitaram a sujeitar-se a estas condições, aceitando-as como norma, sem qualquer protesto, crítica ou reivindicação. As empresas esfregaram as mãos perante a nossa apatia e deixaram de ter limites para a precariedade. Limites esses que deviam ser impostos por nós e não apenas por eles.
Deitaram a ética laboral para o lixo, porque os deixaram fazê-lo. Tiveram a oportunidade de encarar a crise com uma moralidade superior de respeito pelos seus trabalhadores, mas em vez de o fazerem rebaixaram-se ao nível da escumalha mais baixa. Nivelaram por baixo e afastaram-nos da média europeia. Mesmo o sector público que devia primar pela qualidade e dar o exemplo das boas práticas, apresentou-se como a bandeira da precariedade e de como não se deve fazer. Alguns privados foram atrás, os mais pequenos, os que se acham maiores que as suas reais dimensões, os falidos e os gananciosos. Todos seguiram as passadas “anti-crise” do sector público. Todos olham hoje para o empregado, seja ele jovem ou velho, como meras formigas que podem ser espezinhadas ou afogadas a qualquer momento com pouca ou nenhuma consequência. Basta!
Não se deixem levar pela corrente, deixem de ser meras ovelhas obedientes. Imponham os vossos direitos, cumpram as vossas funções mas mantenham a vossa qualidade de vida. Não vale a pena deixar o vosso suor, sangue e lágrimas numa empresa que não vos respeita. Não vale a pena subir na carreira a todo o custo. Há uma diferença entre mostrar esforço e empenho, e dar a imagem de que não se importam de serem escravizados, que só estão ali para servir. Ergam-se, lutem. Escolham bem as vossas batalhas e não desistam delas assim que as encontrarem. Aprendam a argumentar, façam críticas construtivas e acima de tudo imponham os vossos direitos enquanto demonstram serem fortes cumpridores dos vossos deveres. Trabalhadores exemplares com um forte espírito crítico e reivindicativo não passam despercebidos aos empregadores. Sejam a mudança que querem ver no Mundo. O mercado está cheio de ovelhas bem comportadas, não se limitem a ser mais uma na fila para a tosquia.
Está na hora de nos organizarmos numa voz colectiva de individualismo e de exigirmos o regresso da ética laboral e de boas condições a nível salarial e humano. Quando eles disserem que isso é norma em todo o país, mostrem-lhes as excepções. Mostrem-lhes como se faz no resto da Europa e reafirmem a necessidade de nivelar por cima e não por baixo. As próprias empresas se quiserem sobreviver têm que aspirar a serem algo mais do que o seu actual potencial. Uma empresa é um organismo vivo e enquanto as células da sua base continuarem a ser maltratadas, o único futuro possível é o colapso da sua organização.
Levantem-se por vós próprios, por aqueles que vieram antes e por aqueles que ainda hão-de vir. O futuro depende de nós. As próximas gerações vão avaliar-nos pelas decisões que tomarmos agora. É este o legado que querem deixar? Que argumentos vão dar aos vossos netos quando vos perguntarem porque ficaram impávidos e serenos perante tamanhas abominações?
O caminho faz-se caminhando, não sentado atrás de uma secretária a agradecer ao vosso carrasco por cada uma das chicotadas como se de uma bênção se tratasse. Sejam livres, sejam criativos, sejam empreendedores, não tenham medo de sair da vossa zona de conforto, mas acima de tudo, não tenham medo. Arrisquem, reclamem, deixem-se ouvir. Reconstruam o vosso espírito e dêem-lhe asas para voar.
O futuro é nosso. Façamo-lo à nossa imagem.
1 comment:
Por muito difícil que seja pôr isso na prática, não podia estar mais de acordo! Dá-lhe homem!
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