Uma vez disseram-me que eu devia escolher as minhas batalhas, que é preciso separar as coisas pelas quais vale a pena lutar, das outras que não passam de desconfortos de conveniência. Nos últimos tempos tem surgido um crescente descrédito das manifestações dos “ocupas” e “desenrascados” que se fazem ouvir por todo o mundo, e embora me insira dentro desta geração, não deixo de concordar com a maioria das críticas a eles dirigidas.
Vale a pena lutar por mais oportunidades de emprego, vale a pena lutar contra o trabalho precário, vale a pena lutar por um futuro mais seguro, por melhores salários, por melhores regalias e por um tratamento mais humano com respeito pelo trabalhador. São ideais nobres defendidos pelos nossos antepassados ao longo dos séculos, algo com o qual me posso identificar. Contudo, embora estas manifestações se tenham erguido sob a bandeira desta ideologia, algumas questões radicais e impensadas têm ganho um relevo que não mereciam.
Em tempos de contenção financeira há certas medidas que devem ser debatidas e questionadas, mas não todas. O aumento de impostos coloca pressão sobre as famílias, mas tal é necessário para manter os sistemas educacional e de saúde a funcionar. Podemos questionar os restantes gastos, os investimentos mal feitos, mas os erros do passado existem para aprendermos com eles.
Não digo que as medidas actuais são as correctas, pois não o são. Não estamos a cometer os mesmos erros, mas continuaremos a errar enquanto não percebermos que a solução passa por um maior investimento na criação de emprego e de soluções estratégicas para relançar a economia. Isto são pontos aos quais os nossos líderes têm que dar resposta, mas onde podemos ajudar?
O nosso contributo como cidadãos comuns é simples, basta não vivermos acima das nossas possibilidades, não contrair créditos atrás de créditos, investir na educação, de preferência em cursos com um índice alto de empregabilidade e com um posicionamento económico estratégico, e combater o desemprego de longa duração com o risco do empreendedorismo. Mas podemos também ajudar através de medidas simples como comprar produtos nacionais, recorrer ao pequeno comércio e, sempre que possível, andar de transportes públicos.
Num mundo utópico um licenciado sairia da universidade directamente para o mercado de trabalho com o salário adequado à sua formação, contudo, tal não acontece. Embora esteja escrito em decreto-lei que o salário mínimo de um licenciado nunca deve ser inferior a mil e duzentos euros brutos mensais, o grande crescimento do número de licenciados, mais concretamente em áreas com um baixo índice de absorção e mobilidade no mercado de trabalho, torna isto impraticável.
Ao contrário do que muitos dos manifestantes reivindicam não podemos limitar-nos a esperar que nos ofereçam um emprego de mãos beijadas. Temos que construir currículo, temos que nos esforçar para dar o nosso melhor e, acima de tudo, temos que continuar a lutar pelo nosso lugar, sem nunca perder a esperança.
Após ter terminado a licenciatura estive quinze meses desempregado. Iniciei um mestrado numa área com maior empregabilidade que aquela em que me tinha licenciado. e continuei a construir currículo através de projectos não remunerados, de projectos pessoais, e de formação profissional.
Mas já tinha iniciado todo este processo ainda como estudante. Enviei currículos, fui a diversas entrevistas, mas apenas consegui emprego através de um programa do anterior governo. Essa primeira experiência deu-me alento e capacidade para enfrentar um potencial empregador com outras armas que aquelas que tinha até à altura.
Não me conformei com o meu contrato e continuei a procurar algo melhor, com um pouco de sorte encontrei um novo emprego e agarrei essa oportunidade. Todos os meses deixo algum dinheiro de lado, não pedi crédito para comprar carro, tenho um usado com dezassete anos que comprei com as minhas poupanças ainda quando era estudante. Não quero ser um exemplo para ninguém, mas pelo menos não tenho dívidas, trabalho na minha área e consegui tudo isto sem qualquer tipo de ajuda externa, ou plano de resgate.
A luta tão aclamada nas chamadas músicas de intervenção, não é um combate contra um sistema abstracto, mas uma luta pessoal para mostrarmos o nosso melhor, e fazer todos os possíveis para atingirmos os nossos objectivos.
Sim, há injustiças e devemos insurgir-nos contra elas. Temos que nos unir contra aquilo que é incorrecto, contra as medidas erradas, a nossa voz tem que ser ouvida, mas quando ela se elevar acima de toda a contestação não nos podemos engasgar, não podemos limitar-nos a fazer birras e exigências irrealistas, temos que saber argumentar a nossa posição, e reivindicar os nossos direitos.
Temos que nos mostrar solidários com a situação do país, e com as vidas dos nossos compatriotas. Temos que mostrar que somos uma geração capaz de pensar por si, de tomar as decisões acertadas, de lutar por aquilo em que acredita, mas que também é capaz de se conter, e de dar a mão a quem lhe pede ajuda.
Basta de conformismo, já chega de desabafos que terminem com “tem que ser”. Não podemos passar a vida à espera de dias melhores, está na hora de nos desenrascarmos, está na hora de sairmos à rua. Não para protestar, não para exigir mais que aquilo que é dado aos outros, mas sim para nos fazermos ouvir e para conquistarmos o nosso lugar de direito.
Está na hora de dizermos sim ao nosso futuro!
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