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In this world there are only two tragedies. One is not getting what one wants, and the other is getting it.
Oscar Wilde
São as pequenas coisas. São elas que me movem. São elas que mais desejo. Todas as histórias começam com breves momentos de exposição. Informação prévia sobre a vida e o universo das personagens, oferecida pelas subtilezas da narrativa, ou forçada pela garganta abaixo quando a criatividade é escassa.
Nas comédias românticas essa exposição é muitas vezes conhecida por “meet cute”. Aquele momento absurdo e hilariante que junta ambos os protagonistas. O rapaz que vai contra uma rapariga e a ajuda a apanhar os livros. O herói que salva a donzela em perigo. A rapariga que te encontra no elevador e que também gosta de The Smiths.
Aquela primeira troca de olhares. O sorriso embaraçoso. O ódio incompreensível que impede aquela pessoa de sair dos teus pensamentos. Uma longa lista de clichés e lugares-comuns, com presença obrigatória em qualquer comédia romântica. O resto da história é contada nas estrelinhas de encontros e desencontros. Entre coincidências e acasos. Falhas de comunicação. Dramas, separações e reencontros. Um grande gesto romântico no final que ata todos os nós, e que conclui a história como um belo laço de seda, arrumado no topo de uma surpresa ainda por abrir.
Essa surpresa são todas as pequenas coisas que ficam por contar. Os actos mundanos filtrados pelo guião. As rotinas diárias que, fora algum diálogo, montagem, ou encontro inesperado, raramente fazem parte do produto final. As idas ao supermercado. Os passeios de mãos dadas. Brincar com os pratos que queremos comprar quando passamos por uma montra de cerâmica. As manhãs de Sábado passadas na cama. Deixá-la adormecer no teu colo enquanto vêem televisão. As longas viagens de carro e a habitual discussão sobre que música ouvir. Os silenciosos passeios à beira-mar. As brincadeiras com o gato, ou o cão, ou ambos. A partilha de tarefas. E todos os outros pormenores que dizem presente numa vida a dois.
São as pequenas coisas. São elas que me movem. São elas que mais desejo. Pormenores do quotidiano que, talvez por passarem despercebidos, vêem a sua magia ignorada pelo mais comum dos observadores. Contudo, é nestas coisas que penso quando penso em romance. Não. Não ignoro a paixão, o desejo, a química, o momento. Também sonho com inesquecíveis primeiros encontros em que todas as fichas caem no seu lugar. Com a ansiedade do primeiro beijo. Com a possibilidade do não. Com as noites eternas de partilha entre dois corpos apaixonados. Com os pequenos e grandes gestos que um romance nos apresenta.
Mas são as pequenas coisas o que mais desejo. Assim o é, pois tão raras foram as vezes que as tive. O desejo não é permanente, mas sim uma constante que se apaga assim que o seu objecto é alcançado. Com isto não afirmo desejar uma vida de monótona rotina. Não. Desejo sim essa rotina, não pela sua natureza previsível, mas pela magia dos pequenos detalhes, que apenas surge quando a partilhamos com alguém.
O consolo de descobrir uma caixa de Petit Gâteaus entre os congelados quando ela já tinha desistido de procurar. Juntar os pontos para lhe oferecer aquele peluche, desistir da ideia e tentar sequestrá-lo sem ninguém ver. O bolo que fazes antes dela chegar a casa, e que acabas por deixar queimar porque não atinas com aquele forno. Aquela série que vêem ao telefone quando estão distantes. Momentos para muitos banais. Para mim, únicos. Reais. Mágicos.
É a magia do dia-a-dia. É ela que me move. É ela que mais desejo. O Amor é descoberto entre os detalhes. Nas rotinas que partilham. Nos tempos mortos. Nas conversas. No silêncio. No trabalho. Na diversão. Nos sonhos. No presente. Nas tardes aborrecidas de Domingo. No fim-de-semana prolongado em viagem. No adeus no aeroporto. No até já do pequeno-almoço. A dois. A sós. Nas palavras. No pensamento. O Amor está lá. Dia após dia. No romance da rotina.
A paixão do dia-a-dia. É ela que me move. É ela que mais desejo.