Monday, June 03, 2013

Em bom português

Foto: DR
Há quem se veja grego para escrever em bom português. A língua de Camões pode ser a mais bela, mas está longe de ser a mais simples. Contudo, existem pequenos truques para vos ajudar a evitar alguns erros de palmatória.

Costuma-se dizer que mesmo quando toleramos certos erros ortográficos, que ocorrem por distracção ou por pressa na escrita, na maioria dos casos a avaliação da gravidade de um erro resume-se a esta simples dicotomia: Ou a pessoa sabe escrever, ou não sabe.

Infelizmente, a maioria das pessoas que se encaixam na segunda categoria são  vítimas de um mau sistema de ensino, e da sua própria incapacidade de procurar métodos de aprendizagem que os ajudem a escrever em bom português.

A língua é um elemento vivo, moldável e em constante renovação. Adapta-se a qualquer tempo, região ou idade. Nunca é tarde para aprender e nunca foi tão fácil fazê-lo.

Para ajudar todos aqueles que ainda vêem no português um bicho-de-sete-cabeças, deixo aqui algumas dicas úteis para simplificar o processo de acentuação das palavras.

EGA. Não. Não é o da Rua Sésamo, nem tão pouco o Moniz.


Esdrúxula, Grave e Aguda. Nos meus tempos de Escola Primária, a minha professora ensinava-nos a separar as sílabas das palavras batendo palmas entre a entoação de cada uma das sílabas. Vejamos então a palavra “sílaba”. Sí. La. Ba. Esta palavra tem três sílabas e, como todas as palavras da língua portuguesa, apenas as últimas três sílabas podem ser acentuadas.

Essas três últimas sílabas são denominadas de acordo com a seguinte ordem: Esdrúxula (sí); Grave (la) e Aguda (ba). Sempre que tiverem dúvidas sobre se uma palavra leva ou não acento, façam o jogo das palmas. Se a sílaba acentuada for a sílaba esdrúxula, ou seja, a terceira sílaba a contar do fim, então a palavra tem que ser obrigatoriamente acentuada.

Todas as palavras esdrúxulas, ou melhor, todas as palavras acentuadas na terceira sílaba a contar do fim, têm que ser acentuadas. É uma regra da língua portuguesa que não abre espaço a excepções.

Advérbios de Modo (ou aqueles que acabam em mente)


Um dos erros mais comuns, e facilmente evitáveis, é ver um advérbio de modo acentuado. “Rapidamente” escrito “rápidamente” é um dos mais gritantes. Ora, pode parecer contraditório dizer que “rapidamente” não leva acento no primeiro “a” quando ainda há pouco expliquei que a sílaba esdrúxula tem que ser sempre acentuada. De facto, o radical “rápida”, visto que tem apenas três sílabas, é acentuado na sua sílaba tónica. Agora, contem as sílabas do advérbio “rapidamente”. Ra. Pi. Da. Men. Te.

Ao adicionarmos o sufixo “mente” a palavra passa a ser composta por cinco sílabas. Visto que a sílaba tónica já não se inclui nos elementos EGA, esta não pode ser acentuada. Em regra, os advérbios de modo não levam acento.

Há, À, Á. Minha machadinha...


Leitor assíduo das secções de comentários de alguns jornais online portugueses, perco mais tempo a tentar compreender aquilo que as pessoas tentam dizer, do que a ponderar sobre a pertinência do seu conteúdo.

Um dos erros que mais vezes surgem por lá é o uso de uma anormalidade alienígena chamada de “á”. “Á” com acento agudo simplesmente não existe. É o mesmo que dividir por zero. Não se pode dividir por zero, nem tão pouco se pode escrever “à” com acento agudo (á) em vez de grave (à).

Este é dos poucos casos que eu ainda sou capaz de perdoar, pois tive que esperar pela conclusão do meu décimo primeiro ano para que alguém mo ensinasse. Se eu nunca tive um professor de português capaz de explicar algo tão simples, suponho que o mesmo se aplique à grande maioria dos portugueses.

Outro erro menos grave, mas muito mais imperdoável, é a confusão entre o “há” e o “à”.  “À” é usado como uma preposição de lugar ou de modo. Por exemplo “à porta” ou “à moda do Porto”. “Há” é uma forma verbal do verbo “haver” no modo imperativo. É apenas usada quando nos referimos à existência de algo, ou quando queremos definir um ponto no tempo: “há tremoços”, “há três anos atrás”. Quando dizemos “há tremoços” estamos a anunciar que naquele estabelecimento existem tremoços.

A situação que poderá gerar maior confusão acontece quando nos referimos a um determinado espaço no tempo. Quando dizemos “há três anos” estamos a tentar dizer “existem três anos”? Não, o “há” nesta situação vem substituir a expressão “faz três anos”. Uma boa dica para se lembrarem desta regra é associarem o termo “há” à palavra “horas”. Ambas as palavras têm H, e ambas estão associadas à passagem do tempo. Um truque simples para enganarem o vosso cérebro.

Dupla acentuação


Esta é, possivelmente, a regra mais fácil de decorar: Não existe dupla acentuação em português.

Este é um problema bastante comum entre os emigrantes francófonos. Ao contrário da língua francesa, na língua portuguesa não existem palavras com mais do que um acento. “Bebé”, escreve-se apenas com um acento no segundo “e”, e não com dois acentos. Sim, ambas as sílabas são tónicas mas a regra dita que apenas uma delas pode ser acentuada.

Claro que existem algumas excepções facilmente despistáveis. Palavras como “órgão” ou “órfão”, são, à primeira vista, duplamente acentuados. Contudo o til não exerce a mesma função que o acento agudo. O til une o “a” e o “o” formando o ditongo nasal “ão”. É uma conformidade linguística que retirou ao til a função de acentuar a sílaba tónica.

Estas supostas excepções à regra da dupla acentuação, não o são na verdade.

A língua portuguesa é uma das nossas maiores heranças históricas e culturais. É a base da nossa identidade e o elo comum entre Portugal e os restantes países lusófonos. Cabe a nós respeitá-la, promovê-la e cuidá-la. É um exercício que requer algum esforço, mas que no fim acaba por compensar cada minuto desperdiçado.

Com estas dicas, deixo assim a minha contribuição para ajudar todos aqueles que querem aprender a escrever em bom português.

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