Tuesday, June 04, 2013

Em bom português, Parte II

Foto: DR
Ao longo do meu percurso académico tive vários professores de Português. Alguns melhores do que outros. Cada um com o seu nível de exigência e de interesse pelos alunos.

Nunca estudei em escolas privadas, contudo, as escolas públicas que frequentei sempre estiveram bem cotadas nos rankings de desempenho escolar. O meu liceu chegou mesmo a figurar no top 10 nacional. Feito assinalável, tendo em conta que a minha escola secundária não pertence a um grande centro.

Não culpo as minhas eventuais falhas na aprendizagem da língua portuguesa, na qualidade dos meus professores. Embora fosse um aluno exemplar, nem sempre me empenhava a cem por cento. Contudo, assim que identifiquei os meus erros, procurei compreendê-los e encontrar soluções para que estes não se voltassem a repetir.

Hoje em dia existem diversas ferramentas ao nosso dispor para facilitar a compreensão e a aprendizagem da nossa língua. Desde dicionários online, como o Priberam da Porto Editora, a fóruns de discussão e esclarecimento de dúvidas como o Ciberdúvidas.

Não existe qualquer tipo de desculpa capaz de justificar que alguém continue ignorante sobre como se escreve em bom português.

E se, -se ou -sse?


Um dos casos que, ainda hoje, me geram maior confusão é a diferença entre as palavras hifenizadas com “se” e os verbos no pretérito perfeito do conjuntivo que terminam com “sse”. Durante anos evitava usar estes termos, procurando formas de dar a volta à questão usando sinónimos, ou através de um abrasileiramento da frase colocando o “se” antes da palavra, em vez do verbo hifenizado.

Tive que esperar pelo meu décimo primeiro ano para que uma professora me tentasse explicar a diferença entre estas duas formas verbais. A sua explicação, meramente gramatical, de pouco ou nada ajudou. Continuei a basear a minha decisão na sorte e na minha intuição. Felizmente, na maioria das vezes acabava por acertar.

Com o passar dos anos, a minha experiência de escrita, aliada à minha capacidade de aprender com os erros, permitiu-me ser capaz de escrever os verbos na forma correcta sem ter que questionar a sua implementação. O truque que usava era um simples jogo mental. Pronunciava a palavra que queria dizer, sílaba a sílaba. Se a sílaba tónica calhasse na sílaba grave, então sabia que a palavra se escrevia com duplo “S”. Quando tal não acontecia era porque a palavra acabava com hífen seguido de “se”.

Isto pode parecer algo complicado, principalmente para alguém que não sabe pronunciar uma palavra de forma correcta. Felizmente, ensinaram-me recentemente um truque mais fácil para determinar qual a forma verbal que deve ser usada. Basta colocar a frase na forma negativa.

Por exemplo, qual a diferença entre “esperasse” e “espera-se”? Vejamos as seguintes frases: “Agora espera-se que o comboio chegue”; “acreditava que ele esperasse por mim”. Vamos agora colocar ambas as frases na forma negativa: “Não se espera que o comboio chegue”; “não acreditava que ele esperasse por mim”.

Como podem ver, no caso em que o verbo é hifenizado com “se”, na forma negativa o “se” passa para a frente do verbo. Na outra situação, a forma verbal mantém-se inalterada apesar da frase se encontrar, agora, na forma negativa. 

Basta colocarem o “não” antes do verbo, seguido de “se”. Se a frase mantiver o sentido que pretendiam então é essa a forma correcta.

Eu fui, tu fostes, ele foi


Este problema é mais comum na oralidade do que na escrita. Mas comuns também são as pessoas que escrevem como falam. Quantas vezes não sentiram os vossos ouvidos a zumbir sempre que alguém dizia algo como “eu foi ao supermercado”?

Algumas mentes ignorantes de tão iluminadas se acharem, dizem que isto não passa de um regionalismo, e que deve ser aceite, como as dicotomias café/bica, pingo/garoto, ou guarda/chapéu-de-chuva. Essas pessoas estão erradas. É apenas um erro grosseiro. Grosseiro e excessivamente comum.

A explicação é simples, basta recitarem o pretérito perfeito (ou o passado) do verbo “ir”. “Eu fui, tu foste, ele foi, nós fomos, vós fostes, eles foram.” “Foi” apenas pode ser usado na terceira pessoa do singular. Ele “foi” ao supermercado, se foste tu que fostes, então apenas podes dizer “fui”. 

Hífen. Isso é o tracinho, não é?


Graças a uma estranha popularidade do meu anterior artigo, algumas pessoas sugeriram que explicasse a diferença entre os verbos no infinitivo pessoal, e as suas formas hifenizadas.

Embora não me recorde de nenhum caso concreto, é comum ver alguém a escrever num comentário a uma notícia, ou num fórum, algo como “para puder-mos” em vez da forma correcta “para podermos”.

Esta forma hifenizada é uma conjugação pronominal da segunda pessoa do singular do imperativo do verbo “poder”. Enquanto “Podermos” diz respeito à primeira pessoa do plural do infinitivo do verbo “poder”.

Esta é usada quando o sujeito da frase se encontra omitido e é, normalmente, precedida pelas preposições “para” ou “de”. “Para podermos explicar-te, precisas de estar atento”.

“Podermos” não deve ser confundido com “pudermos”. A segunda diz respeito ao futuro do conjuntivo e geralmente é precedida pelas conjunções “se” e “quando”. “Se pudermos ajudar-te, ficaremos contentes com o teu progresso”.

Esta é uma questão de base que apenas surge por causa do uso incorrecto desta forma verbal na oralidade, e por falta de uma formação gramatical mínima, no que aos verbos diz respeito.  

São inúmeros os casos de mau uso da língua portuguesa. A maioria são facilmente evitáveis, bastando para tal informarmo-nos junto dos meios especializados.

Com a actual facilidade de acesso às tecnologias da informação, não existem desculpas para que as pessoas não procurem melhorar a sua qualidade de escrita, ou para que, pelo menos, sejam capazes de evitar este tipo de erros.

Não pretendo iniciar um movimento de defesa do uso correcto da língua portuguesa. Tais movimentos já existem, assim como recursos de livre acesso, que têm como objectivo educar e esclarecer dúvidas sobre como se deve escrever em bom português.

Apenas espero que encontrem alguma utilidade nas dicas que aqui deixei. Que melhorem a vossa escrita. Que sejam capazes de aprender com os vossos erros. E que perpetuem o bom uso da nossa língua materna.

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