Uma Cadeira Vazia, Foto: Adriano Cerqueira |
Já passou tanto tempo. Não me lembro de datas, não tenho noção do tempo. Lembro-me das faces. Lembro-me dos momentos. Lembro-me da dor. Mas não me lembro de mais nada.
Não me lembro da felicidade. Não me lembro dos bons momentos. Não me lembro de sentir. Não me lembro de amar. Não me lembro, pois não há nada para relembrar.
De que vale o apelo de alguém capaz de trocar todas as suas memórias pela amnésia de algo que nunca teve? Vejo esse alguém, como a mim próprio, e não percebo o porquê dele continuar a participar num jogo em que nunca conheceu o sabor da vitória, ou qualquer outro sabor, se formos realistas.
Agora que o vejo novamente a arriscar, continuo sem perceber o que o move. Por que pensa ele que será diferente desta vez? Como consegue uma pessoa não se fartar das mesmas respostas? Das mesmas frases? Das mesmas desculpas?
Vale a pena ser continuamente trespassado e remetido para um ressentimento intenso? Ressentimento esse, que o transfere para um mundo demasiado obscuro e vil, repleto de indiferença, e dor.
O que é esse pote dourado que este sujeito tão tristemente procura, deixando-se levar pelas ondas e intrigas de um destino cruel, que irrisoriamente tenta transformar a sua vida numa cósmica anedota?
Será essa miragem tão valiosa que o faça continuamente insistir, e continuar a levantar-se por mais vezes que seja ferido, independentemente da gravidade dos seus ferimentos?
Duvido que consigas aguentar mais um golpe profundo, por mais que digas a ti próprio que és capaz. Já imaginaste o que vais perder? Não te lembras de tudo aquilo que passaste? De como te encontras agora? Queres mesmo voltar a passar por tudo isto outra vez?
E se desta vez não te conseguires levantar? Se for este o último aviso antes do fim? Por que jogas vezes sem conta com a tua própria vida? Não tens amor próprio? Julgas-te tão insensível à dor? Não chega? Não estás farto? Porquê?
Porque vale a pena. Porque ela vale a pena.