Sunday, November 27, 2016

Terapia facebookiana

Imagem DR
O sucesso na vida poderia ser definido como a expansão contínua da felicidade e a realização progressiva de metas dignas.
Deepak Chopra

Depressão é um termo que não gosto de usar de forma leve. Ao contrário do que tantos costumam partilhar dia sim, dia não, nas etéreas redes de informação, esta doença não é algo que se resolva com uma mudança de ares, com um passeio pela praia, com exercício, com um bom livro, com uma viagem, ou com saídas com amigos. É algo bem mais profundo que exige uma observação séria e o tratamento adequado por parte de um profissional.

Ficar em baixo pelas mudanças de estação, sentirmo-nos frustrados, aborrecidos ou tristes porque algo não correu como queríamos, porque alguém nos magoou, porque fomos enganados, ou porque cometemos a opção errada, não é o mesmo que sofrer de depressão. São apenas sentimentos comuns, pelos quais todos passamos e que podem ser facilmente resolvidos com alguma introspecção, honestidade e capacidade de comunicação e resolução de problemas com quem nos rodeia. E quando essas opções não são suficientes, então aí sim, devemos mudar de ares, viajar, fazer exercício, sair com os nossos amigos, ou distrairmo-nos com um livro, um filme, um concerto ou uma série.

Todas estas distracções não passam disso mesmo se não formos capazes de compreender o que nos levou a sentir assim. Se foi algo que fizemos, devemos assumir a culpa, se foi uma circunstância alheia e fora do nosso controlo, nada podemos fazer se não esperar que tudo se resolva. No fundo, se formos capazes de racionalizar tudo aquilo que nos acontece, o sofrimento não passa de um sentimento fugaz. Obviamente, não somos seres inteiramente racionais e, muitas vezes, usamos o intelecto e a nossa capacidade argumentativa como máscara para esconder sentimentos de culpa ou de desespero para com a nossa incapacidade de controlar os eventos que movem a nossa vida.

As redes sociais, além de servirem de veículo para a partilha de desinformação, são objectos de distracção enganadores. Há cerca de dois anos decidi deixar de usar o facebook. Entretanto regressei, contudo poucos foram os que notaram a minha ausência. Mantive o meu feed do twitter ligado ao meu perfil do facebook e, como gestor de redes sociais, estava diariamente ligado à rede durante o trabalho. Contudo, deixei de usar a minha timeline. Sempre que ligava o facebook entrava directamente na página da empresa que geria, e assim que saía do trabalho, não me voltava a ligar. Aos fins-de-semana usava o Messenger para combinar saídas com o meu grupo de amigos, mas não mais que isso. 

Assim fiz durante um ano. Voltei a usar o twitter com mais frequência. Durante quatro anos apenas o usava para partilhar notícias e ideias soltas. Perdi o contacto com todos os meus seguidores e, sempre que me lembrava de lá ir, sentia-me excluído das conversas. Comecei do zero e, ainda hoje, é a minha rede social de eleição. Uso o twitter para ver as notícias mais recentes, para comentar eventos com os meus seguidores e para partilhar em comunidade as coisas que mais me interessam. Continuo a partilhar notícias e ideias soltas, como sempre fiz, mas volta e meia também me deixo envolver em conversas sobre os mais diversos assuntos. Desde os jogos do Sporting CP, às eleições americanas, a coisas igualmente importantes como a mais recente colecção de minifiguras LEGO, ou o novo filme dos Power Rangers.

Quando enfim regressei ao facebook, estava na hora de fazer uma limpeza na minha timeline. A melhor opção que o facebook alguma vez criou foi a capacidade de deixar de seguir alguém sem termos que a desamigar e sem esta o saber. Comecei por deixar de seguir todas as pessoas cujas publicações tinham fortes possibilidades de me magoar, ou de me deixar mais em baixo. Pessoas negativas, falsas, com constantes argumentos e publicações destrutivas. Pseudo-intelectuais, e pessoas simplesmente chatas. Também deixei de seguir páginas e pessoas cuja partilha de momentos das suas vidas não me faziam sentir bem. Ora por estarem constantemente em baixo, ora por a sua felicidade em vez de contagiante, ser servida como um veneno muito tenebroso para uma alma frágil como a minha se sentia naquele momento.

Confesso que também deixei de seguir algumas pessoas por terem opções políticas diferentes das minhas, ou por serem adeptas de determinados clubes, não por preferir fechar-me numa bolha de opiniões iguais à minha, mas sim por esses exemplares não passarem de cegos incapazes de verem o outro lado da sua argumentação.

Desde então comecei a usar o facebook como nunca. Participo activamente em pelo menos quatro grupos, conheci pessoas, franchises, sites e eventos, muito interessantes e hoje consigo estar atento a promoções que de outra forma não teria conhecimento. Hoje, a minha timeline é uma amálgama de publicações sobre LEGO, Power Rangers, Jurassic Park, material de fotografia e vídeo, e mobília do IKEA, com a ocasional partilha das pessoas que mantive, ora por ter uma boa relação com elas, por serem pessoas que admiro, ou por serem elementos por quem nutro um sentimento neutro, mas cujas opiniões são sólidas e bem construídas, mesmo quando discordam da minha posição.

As redes sociais são uma faca de dois gumes. Podem enriquecer-nos, ou deitar-nos a baixo, e fazer-nos sentir insignificantes. É preciso termos um filtro muito forte para compreender que ninguém é tão feliz como as suas partilhas demonstram, e que ninguém tem uma vida perfeita. O teu amigo que está sempre a viajar, tem saudades de casa e passa mais noites a sentir-se só que a divertir-se. Aquele casal acabou de discutir antes de publicar aquela foto sorridente. Aquela francesinha tinha bom aspecto, mas o pão já estava em papa e o molho não era grande coisa.

Esta é uma visão um pouco cínica. Mas no fundo sabemos que embora haja quem seja sempre sincero naquilo que publica, muitos de nós tentamos passar uma imagem que não corresponde inteiramente à realidade. Eu próprio sou culpado disso, a minha foto de perfil já tem cinco anos, e as fotos que coloco no meu instagram são apenas as melhores seleccionadas de entre centenas. 

A verdade é que nada disto importa. Não devemos comparar a nossa vida com a de ninguém. Devemos seguir o nosso caminho, traçar os nossos próprios objectivos e apreciar as coisas de que verdadeiramente gostamos por mais bizarras, obscuras ou infantis que estas possam parecer. Devemos ser honestos connosco próprios, e devemos usar as redes sociais apenas como um veículo de distracção. O facebook é apenas uma ferramenta que é hoje parte do nosso dia-a-dia. Não é algo que nos define. Não é algo que merece deixar-nos em baixo.

És o dono da tua própria realidade. O resto não passa de mais uma obra de ficção fabricada por autores sem uma gota de imaginação.