Wednesday, May 14, 2014

O Amor não é um jogo, apenas é

Design: Adriano Cerqueira
O Amor não é um jogo, apenas é. Se querem fazer do amor um jogo, então atiro as minhas cartas para cima da mesa, e dou-me como vencido. A minha baliza está aberta, o caminho para o cesto está livre, a minha raquete está no chão. 

Numa relação não existe um vencedor e um vencido. Não existe um resultado em constante renovação. Ou ganham os dois, ou são ambos perdedores. Apenas, e só. 

Se o Amor é um jogo, assumo-me como perdedor. Deito a toalha ao chão, e continuo a jogar. Para sempre perder. Pois este é o único jogo que vale a pena. O único de que nada vale sair como único vencedor. 

Amar é um risco. Um risco que nada me trouxe além de dor, desilusões, e longas noites de reflexão. Um risco que continua a valer a pena. Por mais dúvidas que tenha. Por mais vezes que veja as minhas esperanças serem abaladas. Por mais que a minha fé seja testada. O Amor é a única constante pela qual vale a pena viver. O objectivo mais nobre. O propósito que nos move. A esperança que nos faz levantar todas as manhãs. 

Quando uma relação termina é simples seguir o caminho mais fácil. Atirar as culpas à outra pessoa. Ignorar. Apagar todas as memórias e recordações. Fazermo-nos de fortes. Passar a imagem de que seguimos em frente e de que somos felizes. Mentiras que contamos a nós próprios, para vencer. Para envergonhar a outra pessoa. Para a magoarmos. Para nos vingarmos. Mas este é o caminho errado. 

O caminho certo é bem mais longo e coberto de obstáculos. É dar espaço. Chorar. Guardar as recordações e relembrar os bons momentos. É saber perdoar. Manter o contacto. Valorizar aquilo que ambos partilharam. Aceitar. Seguir em frente, e construir algo novo. 

Pois, quando uma relação termina não há um vencedor e um vencido. Ambos perdem. Perdem as futuras viagens que ficaram por planear. Cada beijo que ficou por roubar. Cada momento para sempre perdido. Cada abraço. Cada história. Cada riso. Cada consolo. Cada dia rotineiro. Quando uma relação termina ambos perdem o futuro que ainda não eram capazes de sonhar. 

O Amor não é um jogo, apenas é. Não dá para fazer pausa. Não dá para desligar. Para guardar, ou para começar de novo. Mas o Amor tem vários obstáculos. A bagagem emocional que todos carregamos. As barreiras que levantamos. O orgulho e a vergonha, com que muitos não sabem lidar. 

O Amor não precisa de uma tabela classificativa. Nem tão pouco de um mercado de transferências, onde a experiência, o prestígio, ou qualquer outro valor arbitrário, dita a viabilidade de uma pessoa. O Amor apenas é. 

E nada me vai fazer deixar de acreditar. Por mais que me sinta a remar contra a maré. Por mais feridas que tenha de sofrer. Por maior que seja o obstáculo. Vou sempre lutar contra a frieza e o cinismo da indiferença. Vou sempre acreditar. 

Quando paramos de lutar. Quando desistimos na primeira curva. Quando não nos damos ao trabalho de sequer abrir a nossa mente à possibilidade de amar abertamente. O Amor deixa de o ser, e passa a ser mais um sentimento descartável que não merece qualquer tipo de atenção. 

Eu sou um perdedor. Dou-me como vencido. Vou cair e levantar-me as vezes que forem necessárias. Mas não vou parar. Não vou hesitar. Vou continuar a perder. Pois o dia em que ambos seremos vencedores, está algures no horizonte. E por mais longo e doloroso que seja o caminho, eu nunca o vou deixar de percorrer. 

Porque Amar é um risco. O único que vale a pena tomar.

Thursday, May 08, 2014

Coleccionar Recordações

Nautilus, Foto DR
He was still too young to know that the heart's memory eliminates the bad and magnifies the good, and that thanks to this artifice we manage to endure the burden of the past.

Gabriel García Márquez

Cada objecto conta uma história. Do processo de fabrico, à origem do material, das mãos que por ele passam, até ao momento em que é comprado. Cada objecto tem a sua história, mas é também ele uma personagem nas vidas dos seus donos. Um narrador omnisciente de breves instantes. Um ícone de um certo local. Uma recordação de um momento.

Objectos que povoam as nossas casas, os nossos quartos, os nossos bolsos, e os nossos corpos. Que retemos, guardamos, exibimos e partilhamos. Há sempre um espaço reservado apenas para eles.

Quando desenhamos o interior da nossa casa, temos uma certa tendência para seguir os padrões que os nossos gostos pessoais, e as modas do momento definem como paradigma. Há certas regras de design de interior que até o mais comum dos leigos procura manter. Jogar bem com as cores, deixar espaço para os objectos e a própria sala respirarem, controlar as entradas de luz, e investir no mais simples dos confortos.

Ir mais além destas bases, já depende da imaginação, e da visão de cada um. Cada casa é diferente. Mesmo entre duas casas idênticas, a decoração interior pode espelhar duas realidades opostas. Por mais regras que existam, não seguimos nenhum padrão, pois, tal como nós, o nosso lar tem também ele personalidade.

A série How I Met Your Mother faz uso de objectos mundanos, aparentemente aleatórios, como instrumentos narrativos que impulsionam a história para seguir em frente. Um episódio gira em volta de uma miniatura de um autocarro amarelo que pertencia à misteriosa mãe, cuja identidade ainda estava para ser revelada.

Esse autocarro, à primeira vista, não passa de um objecto decorativo, que algumas pessoas seriam até capazes de deitar fora em um piscar de olhos. Contudo, para os personagens desta série, as histórias que ele transporta consigo oferecem-lhe um valor incalculável. Para a mãe era uma recordação carinhosa, para o Ted, relembra-lhe o momento em que esteve mais próximo de conhecer a sua futura esposa.

Os nossos quartos estão cheios de objectos de igual valor. Aquela caneca que compraste em Amesterdão, o peluche oferecido por aquela pessoa, o poema que encontraste na praia, o fóssil que te ofereceram quando visitaste aquele cabo, o último livro que leste no comboio, ou aquela moeda de duzentos escudos que encontraste numa velha carteira.

Cada um deles banal. Cada um deles de valor incalculável. Pedaços de ti. Pedaços da tua, e de incontáveis histórias que, em silêncio, as imortalizam, sem prazo de validade.

São esses objectos que, embora pareçam fora de sítio, dão personalidade às nossas casas. São eles que tornam o nosso ambiente único e inimitável. São eles que dão cor aos padrões cinzentos. São eles que fazem de uma casa, um lar.

Cada objecto conta uma história. A sua, e a do seu dono. Cada objecto tem um valor. O material, e o que cada um lhe dá. Cada objecto é único. Quando é nosso. Quando vive. Quando fala. Quando nos faz recordar.

Desliguem a Televisão, fechem os vossos computadores, telemóveis e tablets. Dêem uma volta pelo vosso quarto. Olhem ao vosso redor. Que histórias conta aquele quadro? E aquela fotografia? Conseguem ouvir aquele boneco? Fechem os olhos. Toquem. Sintam-nos. Ouçam o que eles têm para dizer.

Cada objecto conta uma história. Partilhem aquela que acabaram de ouvir.