Wednesday, November 10, 2010

Observações

Hoje é dia 10 de Novembro, uma data como outra qualquer que facilmente me passaria ao lado, não fosse por um simples pormenor: hoje termina o prazo de uma embalagem de Panrico onde ainda me sobram cinco fatias.

Desde a semana passada que sabia que dificilmente seria capaz de usar este pão todo antes do fim do prazo. Comprei-o há semana e meia por pensar que o pão que tinha em casa não era suficiente para aguentar até ao final da semana anterior. Mas não só aguentou, como ainda sobraram algumas fatias. Já quando o comprei fiquei algo reticente: “O prazo termina a uma quarta-feira? Não sei se vai dar”, disse. Mas a embalagem era pequena e a necessidade parecia ser mais urgente. Má gestão, ou uma simples atitude de “deixa andar”, que me impediu de perder alguns segundos para ver a quantidade de pão que ainda me sobrava, colocaram-me agora nesta triste situação.

Não posso dizê-lo com toda a segurança, mas creio que esta é a primeira vez que vou ter que deitar comida fora por deixar passar o prazo de validade. A única alternativa, e a mais óbvia, seria comer cada uma das fatias até à meia-noite de hoje. Mas já desde segunda-feira que este pão tem um sabor estranho. Sabor esse que apenas piorou nos últimos dias. Daí as minhas naturais reticências em lhe dar um destino que não o caixote do lixo.

Posso sempre fazer torradas, mas a torradeira não é minha, e tem um aspecto muito pouco higiénico. Duvido que fosse capaz de comer qualquer coisa que de lá saísse.

Ao falar com alguém sobre este meu pequeno dilema a reacção quase imediata foi: “anda tanta gente a passar fome no mundo”, ao qual respondi: “e ia lhes dar pão estragado?” Confesso que sinto-me mal por deitar comida fora independentemente do seu estado, mas isto talvez seja mais válido em casos de pratos que ficam por “limpar”, ou de refeições feitas em excesso, mas agora, quando a situação retrata um possível perigo de saúde alimentar, a minha consciência está limpa.

Podia fazer umas sandes e oferecer a um sem-abrigo. Mas não só não os há nesta zona, como provavelmente me iriam odiar por lhes oferecer um pão com tão mau sabor. Outros poderiam sugerir que as deixasse para amanhã, afinal o que é um dia a mais, e “eles” são sempre excessivamente cautelosos ao estabelecer os prazos de validade. Se provassem deste pão não diriam o mesmo, acreditem.

Já no último sábado vi uma caixa de hambúrgueres de seitan em promoção no Modelo. Coloquei-os no cesto mas, após uma análise mais atenta da caixa, verifiquei que o prazo tinha terminado naquele dia às sete e meia da manhã. Apesar do preço reduzido, e de estarem congelados, o que garantia pelo menos algum nível de segurança, decidi repô-los na prateleira.

É raro o produto que compre sem prestar atenção ao prazo de validade, algo que mais pessoas deviam ter em atenção. Afinal somos aquilo que comemos, e pelo menos o meu prazo é daqueles que não quero ver expirado.

Tuesday, November 09, 2010

Sensações

Jantar. Mais do que um simples hábito embebido na rotina diária, é também uma necessidade. Mas por mais que a fome, ou a simples vontade de nos alimentarmos, nos force a iniciar qualquer refeição, o jantar é algo mais, é também ele, um evento social.

Não falo dos jantares de curso, de trabalho, entre grupos de amigos, aniversários, festas, familiares, ou até mesmo românticos, mas sim do comum jantar de segunda, terça ou quarta à noite. Uma simples refeição, dois ou três pratos, uma mesa, uma cadeira, e talvez uma televisão. Uma mera equação de relativos factores que se conjugam em mais uma actividade rotineira. Quando vivido a sós, na nossa cozinha, ou sala, é mais fácil de engolir. Prepara-se a comida, vai ao prato, come-se, lava-se a loiça e o dia continua. Já fora de casa, é diferente.

Seja num restaurante, na zona de alimentação de um centro comercial ou numa cantina, o peso de enveredar por esta tarefa a sós é mais evidente. Esperamos na fila ou escolhemos uma mesa onde aguardamos para ser atendidos. Consultamos a ementa, sem nenhuma outra opinião que não a nossa, fazemos a nossa escolha, voltamos a aguardar, comemos, levantamo-nos, pagamos a conta e saímos. Isto sistematicamente, dia após dia, nada de novo, talvez o prato seja diferente, talvez a bebida, mas tudo igual, mais do mesmo.

A sós, jantar fora é mais que o mero saciar de uma fome perpétua, é também uma forçosa observação daqueles que nos acompanham naquele lugar. Estranhos. Alguns, também eles, sós, outros, nem tanto. Sentimo-nos sós no meio de uma multidão. Mesmo com o auxílio das novas tecnologias que nos permitem estar em contacto com alguém enquanto jantamos, a falta de uma conversa, por mais banal que seja, a falta de outra opinião, mesmo contrária à nossa, torna esta experiência sensaborona, insípida, entediante e, vá, chata. Ainda para mais quanto para lá de pontual, tal experiência se torna tão parte do dia-a-dia, como dormir ou respirar.

“Mais vale só que mal acompanhado”, dizem. Talvez tenham razão, talvez nunca tenham ido jantar fora sozinhos vezes suficientes.