Wednesday, December 23, 2009

O Regresso da Véspera da Véspera de Natal Parte III

365 dias, 64 bilharacos, 12 aplicações em max, 3 canções midi, 1 pão-de-ló e 0 pencas depois, está de regresso a véspera da véspera de Natal! A cantar desde 1919.

Esse não era o galo? O azeite queres tu dizer. O azeite canta? Não, o azeite galo. Atum? Ramirez? O que é que isso tem a ver com o Acordo Ortográfico? Nada, mas isto tem:

Vasco da Gama, Eusébio, Sócrates (o filósofo), Camões, Jesus (o Cristo) e o já habitual Mindo, estavam numa terra desconhecida chamada Brasil situada no extremo mais ocidental da Europa. O ano é 2020, e o Acordo Ortográfico está prestes a fazer 10 anos. Tal como o escudo já ninguém se lembra de como se escreve em português, nem tão pouco de como se fala essa língua que, juntamente com o nome do próprio país, há 10 anos que desapareceu da mente dos brasileiros que outrora se auto denominavam portugueses.

Camões está no Panteão Nacional, foi lá dar umas voltas na campa. Tal já faz parte da sua rotina diária desde que alguém teve a brilhante ideia de chacinar a língua que ele sozinho ajudou a imortalizar através de um certo manuscrito chamado “Os Lusíadas” (uma epopeiazita qualquer que nunca ninguém leu, nem tem intenções de ler), e adoptar o Português do Brasil como língua oficial.

Hoje, Eusébio acompanha o seu amigo Camões na sua rotina matinal. De vez em quando o Pantera Negra lá vai dar uma volta à velha Lourenço Marques, se bem que aí nem vale a pena falar-se em português, ou brasileiro, já que há muito é o inglês a única língua que vale a pena aprender – não estivesse a África do Sul mesmo ali ao lado – mas hoje está de regresso a Lisboa.

Não, a selecção não joga hoje, essa nem precisou de esperar pela aprovação do Acordo Ortográfico, os jogadores brasileiros há muito que encontraram na selecção “portuguesa” um óptimo palco para se reformarem e ganharem alguns trocos enquanto o Brasil os ignora por terem vindo jogar para este lado da Península Ibérica, e não para o outro. Teria o Saramago razão em sugerir que nos uníssemos a Espanha para formarmos a mítica Ibéria? Não sei, mal por mal, mais vale ir para a velha Lourenço Marques treinar o meu inglês.

Jesus (o Cristo) toma café com Sócrates (o filósofo) em Santa Catarina no recém-criado Condado Portucalense – a onda de protestos contra o Acordo Ortográfico forçaram o Porto e algumas regiões do norte do país a exigirem a independência, que rapidamente foi concedida, visto Lisboa simplesmente não querer saber.

“Acho que está na altura de experimentar o 4-4-2 losango, aquele Paulo Bento até não tinha uma má ideia”, disse Jesus (o Cristo).

“Mas tu não és o Cristo? O Salvador?”, questionou Sócrates (o filósofo).

“Já não sei, se queres que te diga. O outro consegue ser mais idolatrado que eu, embora tenha sido incapaz de ganhar seja o que for”, respondeu Jesus (o Cristo).

“Isso é subjectivo!” Disse o Mindo que por ali passava.

Já Vasco da Gama, há muito que zarpou em busca de uma terra desconhecida chamada Brasil, mas deve ter dificuldade em entender os novos mapas, pois há anos que anda às voltas entre o Tejo e o Douro sem arranjar maneira de seguir em direcção ao ocidente. Já para não dizer que ninguém aceita ser pago em escudos. Já agora, têm noção que 100 euros são 20 contos? E que dois euros são 400 escudos? Na minha juventude quando me davam 200 escudos eu estava rico e rendia-me durante uma semana! Enfim.

De volta a 2009, Sócrates (o filósofo) questiona-se sobre o porquê das Tardes da Júlia existirem, e pondera sobre o facto (com c) de não conseguir mudar de canal pois por algum motivo incompreensível ao comum dos mortais, ele quer ouvir a história (e não estória) da senhora com dois cães que leva porrada do homem do leite, e que nunca conheceu o seu verdadeiro amor.

Camões está no Chiado a tomar café com o Fernando Pessoa (ou com algum dos seus heterónimos, é difícil distinguir) e a discutir a contratação de João Pereira. Já Vasco da Gama está a criar uma interface em max/msp/jitter para criar um sistema estocástico em midi, através de um algoritmo que o faça descobrir o bilhete de avião mais barato para a Índia.

Jesus (o Cristo), enquanto se prepara para nascer, outra vez, decide ir ao cinema ver o Lua Nova. Duas horas de abdominais esculturais depois, Jesus (o Cristo), decide inscrever-se num ginásio (se ficar como o Jacob talvez arranje uma miúda melhor que a Maria Madalena).

Por fim, o Mindo passa por umas pencas – também conhecidas como covões –, contempla-as por um momento e segue o seu caminho rumo a um horizonte indeterminado. Um infinito de 365 dias incertos que acabam com um constante retorno ao mesmo lugar, ao mesmo dia. “Hey! Isso é subjectivo”, diz.

E assim termina mais um episódio da véspera da véspera de Natal! A todos um Feliz Natal e que o Avô Geada não vos ponha pencas no sapatinho!

Morram pencas, morram! Pim!

Thursday, December 17, 2009

21 Anos, 21 Livros

Não, não li apenas 21 livros em toda a minha vida, nem vou fazer uma lista dos 21 melhores livros que li até hoje. Não, 21 é o número de livros que li durante o ano de 2009. Alguns de vocês podem achar que foram muitos, outros vão pensar o contrário.

Para mim este feito é um verdadeiro recorde pessoal. Habitualmente não perco tempo a contar o número de livros que leio durante um ano, nem tão pouco a catalogar aqueles que li, contudo, a propósito da renovação do design do meu blogue, escolhi colocar no menu direito uma secção dedicada à divulgação do livro que estou a ler neste preciso momento, à qual associei uma lista de todos os livros que fui lendo ao longo do ano, a já afamada rubrica “Cantos de uma estante” – nome original, não acham? Graças a essa rubrica perdi hoje dois minutos do meu tempo para contar os livros que passaram pelas minhas mãos no ano em que completei 21 anos, e não é que li precisamente vinte e um livros nos últimos doze meses? E esta, hein?

Para ser justo apenas li vinte livros, visto ainda não ter terminado o vigésimo primeiro, Um Diário Russo de Anna Politkovskaya. Enquanto folheio por entre as restantes duzentas e poucas páginas dessa crónica da Rússia real – que espero terminar antes do final do ano – reflicto não só sobre a quantidade de livros nos quais emergi os meus olhos, e a minha imaginação, ao longo destes meses, mas também sobre a qualidade dos mesmos.

Termino o ano com aquela que é a última obra de Politkovskaya antes de ser brutalmente assassinada simplesmente por se opor ao regime de Putin. Um livro que retrata os factos reais por detrás das eleições para a Duma de 2003, e da reeleição de Vladimir Vladimirovich em Março de 2004, dando ainda relevância a acontecimentos que no mundo ocidental seriam considerados crimes contra a humanidade, mas que na Rússia de Putin nem chegam aos telejornais.

O meu último livro de 2009, o meu vigésimo primeiro livro do ano em que fiz 21 anos, é essencialmente uma análise de hard news, que talvez nunca chegasse a ser conhecido pelo resto do mundo, não fossem as circunstâncias da morte da sua autora. Ao pegar neste pequeno exemplo talvez esperem encontrar outros livros do género nos “cantos da minha estante”.

De facto, é bem provável encontrarem um ou outro, mas vamos dar uma olhadela no plano geral e ser mais analíticos na quantificação dos livros que lá figuram. Este ano, não li apenas um, mas cinco livros da Stephanie Meyer. O que representa quase um quarto do total. Entre os livros desta escritora medíocre que mal consegue juntar duas ideias e que vive com um constante medo de causar qualquer tipo de dano (físico ou emocional) às suas personagens, – medo esse que a faz sacrificar por completo a história principal apenas para não “magoar” os seus “queridos” leitores – encontram-se obras de grandes escritores. De Eça de Queirós a José Saramago, de Arthur Conan Doyle a Fernando Pessoa, de Dostoevsky a Kafka. Estarei a ser simpático ao dizer que o meu espectro literário é bastante alargado.

Na lista consta uma repetição, que de repetido nada tem: The Lost World. Embora já andasse há anos para ler o original de Sir Arthur Conan Doyle, é o mundo perdido de Michael Crichton que mais me impressionou. O livro, como sabem, serviu de inspiração para a sequela do Jurassic Park – aquele que para mim é o melhor filme da trilogia – contudo, tal como acontece com a primeira obra de Michael Crichton, o livro consegue ser muito melhor.

A história de The Lost World é completamente diferente daquele que Spielberg imortalizou em película. Embora tenha um pouco menos de acção, não só é muito mais realista como tem mais história, maior desenvolvimento das personagens, e é simplesmente uma óptima leitura, quer se seja fã de Jurassic Park, ou não. O meu paleontólogo interior tende a discordar com algumas das aferições que o Michael Crichton insiste em fazer. Mais concretamente acerca dos poderes de camuflagem do Carnotaurus, mas a verdade é que da perspectiva do meu eu leitor e do meu eu escritor, a qualidade do livro no seu todo foi uma grande surpresa pela positiva.

Alguns dos livros não tiveram a atenção merecida. Muito por ser um paperback que custou-me pouco mais de uma libra no Amazon, mas também por me ter limitado a lê-lo no comboio, e de vez em quando nos Jardins do Palácio de Cristal quando, nesta Primavera, tinha que fazer horas para a aula de Russo, não me lembro de nada sobre o que se passava no Notes from the Underground. Este é um defeito que não sou capaz de compreender. Às vezes sou capaz de passar vários minutos a ler um livro, mas a minha mente divide-se como que em duas personalidades, e embora esteja de facto a ler o livro, os meus pensamentos estão noutro lado e não consigo lembrar-me de uma única palavra que tenha lido.

É uma pena que tal tenha acontecido com o meu primeiro contacto com a obra de Dostoevsky, contudo, pretendo compensar este pequeno livro e dar-lhe uma segunda tentativa de leitura quando encontrar um intervalo na minha lista de livros para ler. Geralmente quando isto me acontece, uma certa passagem no livro, ou uma súbita alteração na história, fazem-me regressar à realidade e acabo por reler a passagem que “perdi”. Nunca antes me aconteceu perder um livro por inteiro, infelizmente foi com um daqueles que mais interesse tinha em ler.

Restam-me 14 dias para terminar Um Diário Russo, tempo mais do que suficiente. Mesmo com as festas, apenas um sério caso de preguiça (ou um súbito desinteresse total pelo livro) me faria desleixar dessa forma. Tenho agora que dar lugar a 2010, e arranjar um novo canto na minha estante para os romances que anseiam por serem lidos.

Conseguirei chegar aos 22? Irei ultrapassar essa marca, ou será 2009 aquela pequena excepção na minha vida de alimentação literária? Daqui a um ano cá estarei para responder.