Saturday, July 22, 2006

Screaming into the Dark

Quantos dias teriam passado? Que luz era aquela que lhe encadeava os olhos? Alguém podia saber, mas ele já não tomava conta dos dias, nem tão pouco se importava com o que se passava à sua volta, mesmo que esta luz lhe doe-se como se as suas Íris estivessem a arder.

Hoje não seria um dia diferente, apenas mais um dia daqueles que vieram a seguir ao impensável. Mas ontem houve algo diferente, um simples telefonema, que não fosse pela persistência da chamada, nunca teria sido atendido. A voz do outro lado apanhou a sua atenção. Seria mais um palhaço a tentar enchê-lo de propaganda enganosa? 

Desta vez não. A voz era familiar, alguém do passado, alguém que tinha boas notícias, coisa rara por estas bandas. Apesar do cepticismo ele concordou em encontrar-se com a voz. Mal se apercebeu de que a luz era a de mais uma amanhã, a manhã do dia seguinte, do dia que tinha algo para fazer. Despertou, e preparou-se para ir ao seu encontro.

Ainda era de manhã quando se encontraram. Já tinha passado alguns anos desde a última vez que se viram, mas qualquer sentimentalismo, ou saudade, eram coisas que não podiam ser associadas a este momento. A voz pertencia ao seu filho.

“Vem. Descobri uma maneira de a salvar.”

“Foi para isso que me chamaste? Não tenho tempo para parvoíces.”

Virou as costas para se afastar, mas parou quando sentiu o seu braço a ser agarrado, puxando-o para trás.

“Se fossem parvoíces não te teria chamado!”

Ele viu nos seus olhos que ele dizia a verdade. 

Entraram ambos num armazém, ao fundo estava uma estrutura metalizada oval, com uma cadeira no centro, como uma espécie de cápsula.

“Entra lá dentro”, disse o seu filho.

“O que vai acontecer?”

“Consegui fazê-lo, posso levar-te ao momento antes...”

“‘Tás à espera que acredite que aquilo é capaz de contrariar as leis do tempo e do próprio destino?!”

“Do destino, só cabe a ti descobri-lo, mas do tempo sim. Agora, entras lá dentro ou vais continuar a desperdiçar o resto da tua vida?”

“Hmm... Sempre foste muito teimoso...”

Ele entrou na estranha cápsula, apesar de continuar céptico, uma pequena onda de esperança começava a formar-se dentro dele. Depois do seu filho accionar o mecanismo inicial, e de lhe explicar o que tinha de fazer, a cápsula fechou-se e ele adormeceu.

Alguém sabe o que é perder um verdadeiro amor? Talvez ninguém, mas ele sabia-o. Tudo aconteceu há uns meses atrás. Ou já seriam anos? Pouco importa, a data precisa perdeu-se nos fios do tempo. Numa fresca noite primaveril, passeavam pela floresta, nada havia a temer. Já o tinham feito muitas vezes, mas algo estava diferente, ele não se sentia ele, todo o seu poder tinha desaparecido. Sentia-se normal, mas estando ela ali, não havia tempo para pensar nisso. 

Aquela noite foi mesmo muito diferente. Da escuridão surgiram algumas sombras que sem aviso ou qualquer tipo de motivo decidiram atacar. Eles fugiram até onde puderam, mas as sombras encurralaram-nos. Ele tentou lutar, mas eram meras sombras, e ele sentia-se muito enfraquecido como nunca antes se tinha sentido. 

Três foram as flechas que trespassaram o peito da sua companheira, que ali jazia apenas com forças para um último olhar. Com isto o seu poder retornou, mil vezes aumentado pela raiva, e pela dor. Com facilidade derrotou as sombras, mas porque é que o seu poder se tinha dissipado? Porque tinha ela de morrer? Chegou o dia de obter a resposta a estas perguntas.

A cápsula finalmente chegou ao seu destino. Despertou, quando ela se abriu. Olhou para as horas, já faltava pouco tempo, tinha que se despachar. Estava na mesma floresta, exactamente como se lembrava. Decidiu antecipar-se e procurou o local onde eles tinham sido encurralados. Lá, esperou que eles chegassem. Um movimento chamou a sua atenção, pouco tempo depois. Lá estavam eles, e lá estavam as sombras. 

Concentrando todo o seu poder dirigiu um jacto de energia destruindo todas as sombras. Mas as flechas já tinham sido lançadas. Só havia uma coisa a fazer. O último sacrifício por quem ele amava. Colocou-se a si próprio em frente delas e assim foi ele atingido em vez dela. Logo ali desapareceu. O universo inteiro rodou na outra direcção. O destino e a vida de ambos voltou ao normal, como se o encontro das sombras nunca tivesse acontecido.

O sacrifício de alguém que morreu naquele dia, culminou na sua verdadeira morte. Era o que tinha a fazer. Ele podia já não existir, mas o seu outro Eu, que não passa dele mesmo, esse nunca terá que passar por aquilo. 

O seu filho talvez soubesse que era assim que as coisas se viriam a desenrolar, mas nem ele próprio guardou memórias do herói que o seu pai nunca foi. Esta amostra de verdadeiro amor ficou perdida no tempo. Esquecida para sempre, mas eternamente viva nas vidas que foram salvas naquele dia, e nos destinos que se alteraram.

Tuesday, July 11, 2006

Out on the Edge

Escadaria em Espiral do Museu do Vaticano
Nos últimos tempos tenho reparado na maneira como as coisas estão interligadas, e como interagem entre si. Ao abrir os olhos somos capazes de reparar em todo o tipo de coincidências. Como naquela noite em que estava a fazer zapping e acabei por ver três filmes onde, por meros segundos, o mesmo tema surgia, inclusive quando este pouco ou nada tinha a ver com a história.

Qualquer um podia interpretar isto como algum tipo de sinal, mas a verdade é que não me lembro de que tema se tratava, logo, a importância dessa situação acaba por aqui.

Há uns anos atrás, estava aborrecido a ver TV e decidi mudar para o MGM. Estava a dar um filme que achei bastante interessante e que, apesar do meu cansaço, decidi ver até ao fim. Alguns meses depois, repetiram esse filme e também o vi até ao fim. No final, tocavam uma música que, tal como o filme, agradou-me bastante.

Da última vez que vi o filme, decidi pesquisar pela música para fazer o download da mesma. O único problema foi que voltei a não apanhar o nome do filme, nem o nome da música, e, apenas conseguia lembrar-me de parte da letra. Com isto tentei procurar a música mas os meus esforços foram em vão.

De vez em quando lá tentava outra vez, mas nem o Google parecia ser capaz de me ajudar. Estava prestes a desistir quando, recentemente, lembrei-me de procurar por fóruns sobre filmes e perguntar por lá se alguém era capaz de me dizer o nome do filme.

Podia não me lembrar do seu nome mas lembrava-me de todos os detalhes mais importantes. Felizmente, consegui a minha resposta. O nome do filme era "The Heavenly Kid" de 1985. Coloquei este nome no eMule e lá encontrei a banda sonora com a música que eu queria.

Ao carregar no play deixei-me assolar por um profundo sentimento de concretização por finalmente ter encontrado a música. Mas esse sentimento foi breve, pois quando a música chegou a meio, apercebi-me que esta era muito repetitiva e pouco interessante.

Depois de tanto tempo de pesquisa, sinto que o meu esforço foi em vão, pois não gosto da música. Mas na verdade não foi totalmente em vão. Descobri o nome do filme, e agora posso vê-lo sempre que quiser.

Com esta história tento chegar a uma analogia. Uma certa teoria diz que nós só queremos aquilo que não temos. O que até faz sentido, se o temos não o devíamos querer, pois já o temos.

Da mesma forma, aquilo que queremos é aquilo que desejamos, e ao termos algo deixamos de o desejar. Segundo esta lógica corremos o risco de nos sentirmos constantemente frustrados.

Onde quero chegar é que não importa o quanto queremos algo, se algum dia o chegarmos a ter, vamos deixar de o desejar. Tendo em conta o que se sucedeu com a música, com muito esforço somos capazes de atingir os nossos objectivos, e deles até somos capazes de obter algo interessante. Contudo, na maioria das vezes, acabamos por sentir que todo aquele esforço foi em vão, e que não valeu a pena.

Mas como tudo está interligado, e esta metáfora de vida não é nenhuma verdade absoluta, acabo por retomar um raciocínio anterior, que também pode ser retirado desta história. Sim, pois em verdade vos digo, como já dizia o poeta, "Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena."

Sunday, July 09, 2006

Infernal Headache

Nunca tiveram uma daquelas dores de cabeça agudas que simplesmente não desaparecem? Não? Pois, eu já. Estou a ter uma no preciso momento em que escrevo este artigo. Esta já dura há uns meses, há dias em que nem se nota muito, mas por mais que acorde bem disposto e sem dores, acabo o dia sempre com a mesma dor.

Cansaço? Talvez. Muitas vezes sinto-me a ser puxado até ao limite da exaustão, mas a verdade é que já nada é capaz de explicar isto. Nos últimos tempos a dor intensificou-se, o que até é compreensível tendo em conta que estive em época de exames e o meu passatempo preferido foi ler repetidamente vários livros com letras muitas vezes bastante pequenas. Ainda bem que não tiro apontamentos, se não aí bem que precisaria de umas lentes novas.

Muitas vezes penso se não devia apresentar o meu caso a alguém que soubesse analisar a situação, talvez encontrasse aqui alguma coisa nova, e se nela encontrassem a cura também ficaria muito agradecido. Até tomava uma aspirina, mas a verdade é que não acredito muito no seu efeito e também não vejo que diferença é que esta seria capaz de fazer.

Alguma sugestão? Sobre este assunto estou totalmente aberto à vossa opinião, a menos que esta remeta para o consumo de um qualquer tipo de droga aprovada medicamente.

Quais são então as causas desta infernal dor de cabeça? Comecemos por analisar os principais suspeitos:

Sol. Em muitos dias basta levar com ele, nem que seja apenas por uns segundos, para que sinta uma dor que dura o resto do dia. Contudo, em dias nublados isto também acontece, e houve, inclusive, algumas raras ocasiões em que o contacto com o Sol não teve efeito algum;

PC e TV. Talvez. Passo um tempo considerável em frente a estas coisas, mas nem sempre as dores aparecem por causa delas, pois em dias em que não lhes toco também as tenho;

Mau dormir. A minha média fixa-se entre as cinco e as seis horas de sono diário. Deito-me regularmente sempre depois da uma da manhã e raramente consigo adormecer antes das três. Isto acontece mesmo em dias em que tenho, ou em que acabo por, acordar às sete da manhã, ou pouco mais tarde do que isso;

Rotina diária. Talvez o problema nasça do facto de todos os momentos passados em casa envolverem os constantes gritos da minha avó e da minha mãe, cujas vozes há muito deixei de suportar, fosse em que tom fosse. Mas isto apenas ajuda a aumentar e a prolongar a dor. Não creio que sejam a sua principal causa;

Uma mistura de todos estes factores. Acredito que sim. A única maneira de o comprovar seria tirar um dia para me deitar à meia-noite ou até mais cedo. Acordar por volta das oito ou das nove da manhã e ir acampar para um sítio fresco e à sombra. Longe da civilização e sem ninguém ou algo que faça qualquer tipo de barulho.

Se no final desse dia não tiver dores de cabeça, encontro aí a solução para os meus problemas: Tenho que alterar a minha rotina.

Se isso não resultar, temo que isto seja mais grave do que parece. Apenas posso esperar que, como todos os meus problemas, este acabe por simplesmente se resolver por si só. Ou então, ter esperança que a dor vai desaparecer sem alguma vez reparar que ela tenha sequer surgido.

Até lá, vou ter que continuar a aguentar com mais uma dor que, comparada com outras, até parece uma mera inconveniência.

Sunday, July 02, 2006

Tapete da Sala

Na minha sala há um tapete. Tapete esse que sempre ali esteve, ou assim penso. Não consigo lembrar-me de uma memória de infância passada nesta sala sem que este tapete ali estivesse.

Quantos anos tem este tapete? Que histórias pode ele contar? Talvez jamais alguém o saiba. Apesar de tudo, não passa de um tapete. Mais velho que eu. Tão velho que talvez me sobreviva. Sempre ali, estendido no mesmo sítio. Pronto a receber os pés e o calçado de todos aqueles que por aqui passam.

Vida de tapete não é vida fácil. Leva de vez em quando com todo o tipo de partículas imagináveis. É sujeito a vassouras e aspiradores. Para não falar de quando tem que ser lavado. Esfregonas de água fria, e espuma dos mais variados químicos, a envelhecer este já muito experiente tapete, que bravamente sobrevive a todas estas aventuras, acabando, enfim, por tostar ao sol numa bela tarde de Verão.

Não é fácil ser tapete. Nos contos de fadas talvez hajam tapetes que voem, ou que tenham poderes especiais, mas não este. Este é um simples tapete, que todos os dias ocupa o seu lugar na fria tijoleira que ele cobre.

Que marco desta casa. Que ícone despercebido. Um símbolo de um lar, de uma sala, de uma vida. Um simples tapete, que é muito mais que isso.

Como seria o Mundo sem este tapete? Talvez outro ocupasse o seu lugar, mas esse Mundo não existe. E, por enquanto, é este o tapete que lá cumpre a sua tarefa, até ao dia em que tiver que descansar.

Pequeno tapete cuja grandeza ultrapassa a sua própria existência.